Você, Federico, nasceu chorando. Ensopado de líquido de placenta, um berreiro enorme, 6 da manhã e já trazendo lágrimas aos rostos dos pais. Foi um momento maravilhoso que vivemos há três meses. E o mais engraçado, filho, é que esse primeiro ato realizado na sua vida aqui fora será repetido porque humano é. Mas que quando você for crescendo tem gente que vai achar terrível. Explico algo para você, mas, primeiro, preciso voltar para 2014.
O país que você nasceu já recebeu duas Copas: em 1950 e há quatro anos. Nessa última edição, um jogador brasileiro ficou muito marcado porque fez o mesmo que você. Thiago Silva, um zagueiro, que, você sabe, é admirado por destruir intenções ofensivas do adversário. Um louco. Mas se entende, ainda mais hoje em dia, onde não tomar gol é essencial. Pois Thiago Silva chorou muito na Copa brasileira, Federico.
Depois do 7 a 1, jogo em que ele nem fardou, o mundo caiu nas costas do defensor que tem o sobrenome mais comum nessa terra verde-amarela – que alguns querem que seja verde-oliva. O melhor zagueiro brasileiro do último quadriênio chamou o pranto após a vitória contra o Chile no Mineirão (o Brasil venceu nas penalidades, meu filho, e Thiago não quis bater o seu, implorou para Felipão que fosse o último da lista). Thiago ficou marcado na paleta. Muito mais porque "chorou na frente de bilhões", porque "não aguentou a pressão".
Nós, Federico, achamos feio quem chora. Criticamos desde criancinha. O choro atrapalha e todo mundo é criado no "proibido chorar". É feio na frente das visitas, é horrível em público. É tipo um campeonato mundial de quem não chora. Seu pai, por exemplo, certa feita, numa intersséries na Bahia, perdeu um jogo decisivo. O outro time, o Jardim A, era melhor mesmo. Defesa mais postada, tinha um guri tipo Thiago Silva na zaga deles. Foi horrível, e a choradeira pegou. Meus coleguinhas me abraçaram, levantaram a minha cabeça e ali, naquela quadra nordestina desisti da carreira futebolística. Uma lástima para o futebol brasileiro, claro.
Mas, Federico, este é o mundo que você está chegando. Chorar é defeito. Fico dividido no que lhe falar. Porque no país onde o bicho pega de verdade chorar pode ser um problema mesmo. Então vamos bolar um plano para que o seu choro seja firme e não um saco. Chore na frente dos pais. Quando a dor de amor chegar. Quando seu time perder e, sim, Federico, chore na frente dos outros.
Porque chorar é o desdobramento de uma emoção. Quero meu filho leve, mas focado. Quero ele preocupado, mas firme. Quero ele emotivo, mas duro quando precisar.
Quero como Thiago Silva, quatro anos depois do choro de Belo Horizonte, melhor jogador brasileiro da primeira parte da Copa russa. O central brasileiro tão criticado por desabar em uma pressão de oitavas fez gol contra a Sérvia, Federico. O que torna o futebol especial. O que torna Thiago um personagem que deve reescrever sua história na maior competição do mundo. E que ensina que chorar pode até doer no dia e lhe transformar num — agora usarei uma linguagem futebolística, filho — cagão aos olhos alheios. Mas que isso tudo é curado com trabalho e raça. E, de preferência, competência.
Seu pai já vai ficar feliz só em te ver correndo atrás. Porque nas tuas alegrias e tristezas o que mais farei é chorar. Na sua frente. Abraçando ou consolando. Foi isso que senti naquela manhã de março com você todo ensopado e chorão.