A vida é arte do encontro, embora haja tanto desencontro na vida — Vinicius de Moraes definiu tudo assim. Ele tá certo. E rolou isso dias desses… Amigão, de anos, de infância, de colégio, num aeroporto. A famosa espera no portão de embarque, pessoal se organizando e não respirando, os grupos para entrar na aeronave, "não, senhora, agora é o grupo 2 e a senhora é do grupo 4, aguarde ali que já vamos chamar".
E um cara igual ao cara que estudei junto chega em mim. "Luciano?" Sim. Sou eu. E tu? "Anderson, cara! Do Emílio!" Emílio Zuñeda, nosso colégio no Alegrete! Era o Anderson!
Despenquei a falar! Só eu! Contando o porquê estava ali para o voo, o que eu estava fazendo da vida, meus filhos, o Inter, onde estava morando. Reclamando que precisava ir para São Paulo para só depois pegar outro avião para Curitiba. "Vou passar por cima de Curitiba duas vezes para chegar nela." Eu não parava de falar, e ele sorrindo, sendo participativo em silêncio, sabe, largando palavras de alento para minhas histórias, sendo educado, me ouvindo, se deliciando com minha vida cheia de trabalho, filhos e felicidade com perrengues normais, nada sério.
A moça grita "grupo 3". É ele. Nos abraçamos, ele confere o bilhete: poltrona 23 D. A minha: 12 A. Ele se foi. Eu, grupo 5. Não o vi mais. Só eu falei.
Viagem seguiu, desci correndo para a conexão. Não sabia se ele ficaria em SP, se iria para Curitiba ou outro lugar do Brasil ou do mundo. Só falei. Não perguntei. Não deixei o cara falar.
Fiquei com isso guardado. Lembrei o sobrenome e fui para a internet. Achei! Anderson virou médico. Aparentemente uma vida entre Brasil e EUA. Montou uma família também. Casal de filhos. Especialidade dele é Psiquiatria. Apareceram alguns estudos sobre saúde mental na infância com o nome dele. Em inglês, claro.
Ele viaja bastante e também dá palestras. Fotos com slides ao fundo em inglês. Ele também dá bastante tempo para viajar com os filhos e a mulher. Tem cachorros. Ainda não descobri ao certo se ele mora no Brasil ou fora.
Mas deu pra ver que ele ajuda pessoas. Contribui para a saúde mental delas. E descobri isso stalkeando um cara que reencontrei depois de décadas e não deixei ele falar. O cara me abraçou forte, me procurou no portão de embarque, me ouviu atenciosamente, e eu? Não retribuí.
Insensível. Boca aberta, como falamos por aqui.
Prometo ouvir mais as pessoas e não perder oportunidades de observar as belezas das vidas dos outros em silêncio.
Falhei, Anderson, falhei…