As estatísticas estão tatuadas nas costas de Fernando Diniz. São ruins: primeira derrota para o Uruguai em 22 anos, primeira vez que perde três seguidas nas Eliminatórias, primeira derrota como local (e ainda para a Argentina, no Maracanã!), sexto lugar na tabela. Porém, os números precisam ser vistos em um contexto. Eles são a parte visível, mas não mostram tudo.
Estamos diante de uma Seleção Brasileira sem rumo. Ou melhor, à espera de que Carlo Ancelotti cumpra sua palavra e desembarque aqui em junho para dar um rumo a ela. Embora, o campo nem esteja tanto assim sem rumo. Agora, o que acontece antes dele, isso, sim. A Seleção é o resultado da CBF, que se reconfigurou depois da Copa e centrou suas decisões na caneta do presidente Ednaldo Rodrigues. Não está funcionando.
O jogo de terça-feira (21) tem elementos suficientes para que se discuta em profundidade o que acontece com o futebol brasileiro. Os problemas seguem os mesmos: calendário, má qualidade da arbitragem, VAR questionado, gramados ruins, clubes desprotegidos da rapinagem sobre seus jovens talentos, quebradeira entre os de menor tamanho, ausência de projeto para fomentar a revelação de jogadores.
O ponto é que, pelo menos, a Seleção andava de vento em popa. Era o nosso melhor produto, camuflava para o mundo externo nosso futebol com a pujança técnica. Agora, nem isso.
Estamos, é verdade, numa troca de geração. Mas era sabido que Neymar, aos 30 anos, talvez fosse só uma figura de peso em 2026. Se chegasse até lá no nível mínimo que se exige dele. Sabíamos que Casemiro, uma das lideranças, também teria poucas chances de manter-se como top de linha até 2026. E que Thiago Silva, aos 38 anos, dava adeus.
Ou seja, as principais lideranças estavam de saída e seria preciso um trabalho consistente para construir uma nova Seleção. Em fevereiro de 2022, no Redação SporTV, Tite avisou o Brasil que ele não seria o comandante desse projeto.
Tivemos 10 meses até o final da Copa do Catar para escolher um novo técnico, com critério, calma e análises profundas. O que fizemos? Tentamos tirar o técnico do Real Madrid no meio da temporada. Ou no final dela. Do Real Madrid. Não é o técnico o Mallorca, do Betis, do Sevilla. É do maior clube do mundo. Ele ganhou a Liga dos Campeões e avisou que cumpriria seu contrato até junho de 2024.
Assim, começamos com Ramon Menezes. No fundo, um fio de esperança de acertar o tiro na lua que a Argentina acertou, com o técnico da sub-20. Não deu, claro. Isso é como acertar na Mega Sena, com Messi ainda te assoprando metade dos números.
Partimos para Fernando Diniz, um técnico disruptivos, autoral, que entra na cabeça dos jogadores e os faz atuar em seu modelo. Numa Seleção em que todos já estão milionários e atuam nos maiores clubes da Europa, fica difícil convencer jogador a fazer diferente do que fez a vida inteira. Ou faz ouvindo Klopp, Guardiola, Arteta. Ah, e convencê-los tendo sete, oito dias juntos a cada 45 dias. Não deu certo, claro.
Diniz é o menos culpado. É preciso olhar o todo. O Maracanã deixou lições. Não se prenda ao resultado. Olhe o que aconteceu no todo. Nem organizar as torcidas nas arquibancadas se conseguiu. Imagina organizar um projeto de Seleção. É bem mais difícil. Que São Carletto nos salve.