Fomos no El Clásico. Eu e o Mick Jaeger. Ele perdeu, eu ganhei. Até porque não tem como sair derrotado de um jogo desses. O caso do Mick é diferente porque, vocês sabem, ele costuma zicar os times para os quais torce. No meu caso, eu desfrutei cada segundo de um dos grandes momentos da minha vida futeboleira. Para quem ama esse jogo, estar em um Barcelona x Real é como visitar a Disney - para a gurizada, ou curtir um show do paul McCartney, do U2 ou do Rolling Stones. É algo único, uma experiência que, possivelmente, seja única na sua vida.
Antes de tudo, no meu caso, já começou sendo uma experiência diferente porque eu estava ali na arquibancada. Fazia tempo que eu não me sentava numa para desfrutar de uma partida. E foi um partidaço. Um jogo de Copa do Mundo disputado por dois times. Haviam duas seleções em campo, com alguns dos melhores do planeta. Assim, foi servido um banquete de futebol.
Ninguém deu chutão, ninguém se atirou no gramado como se tivesse sido operado, nenhum goleiro foi derrubado pelo vento ou sentiu as piores dores depois de uma defesa. Era só a bola e os 22 caras jogando por ela. De pé em pé. Poucos passes foram errados. Carrinho, um que outro e só na extrema necessidade.
A nota tristíssima e única, senão, nesta tarde tarde: Vinicius Junior, mais uma vez, foi vítima de racismo. Uma chaga que precisamos extirpar, mas que, aqui, ainda parece longe. O sujeito que cometeu o ato está sendo identificado.
O Real Madrid ganhou, numa virada estratégica absurda de Carlo Ancelotti. Ele mexeu as peças, alterou o formato do time no intervalo e viu Jude Bellingham fazer dois gols e mudar o roteiro da tarde. Bellingham, podem me cobrar, será melhor do mundo ali na frente. É daqueles que parece não fazer esforço para jogar. Faz parecer simples algo complexo que é correr e pensar com a bola no pé. Tivemos um jogo bem dividido. O Barça sobrou no primeiro tempo, o Real foi superior no segundo. O Barça deixou de resolver tudo em 45 minutos. Preço da juventude. O Real soube desatar um nó. Privilégio da maturidade.
Fora o espetáculo no campo, foi uma tarde para experimentar o modo europeu de consumir futebol. Cheguei cedo ao Estádio Olímpico. Usei o metrô (que inveja deles!), desci na Plaza Espanya e subi o Montjuic a pé. Quatro escadarias, passeios arborizados, circundei o Museu de Arte da Catalunha e curti uma vista deslumbrante de Barcelona. O Estádio Olímpico está dentro do parque construído para a Olimpída e cercado pelas instalações usadas em 1992, como o complexo de piscinas, o campo de beisebol e o Palau Sant Jordi, onde ganhamos o ouro com o vôlei.
Os torcedores só faltando duas horas para o jogo é que lotaram o amplo espaço do parque. Alguns se sentaram na esplanada com colunas romanas e a pira olímpica para tomar uma cerveja (cara, 10 euros) e comer um lanche. Em um canto mais silencioso, seis muçulmanos rezavam virados para Meca. Crianças jogavam bola no gramado. Os portões só abriram às 15h, pouco mais de uma hora antes do jogo. O que estimulou o consumo nos quiosques e nas lonas do Barcelona – são tantas que você dificilmente resiste de levar a manta do jogo, com símbolo dos Rolling Stones, a 15 euros, ou a camiseta, a 190 euros. A entrada no estádio foi rápida e tranquila. Ingresso no celular, leitura na catraca e lugar marcado. Cada um no seu. Dentro, mais lanchonetes e... loja do Barcelona.
Fim de jogo. Quase 50 mil pessoas desceram juntas as escadarias e tomaram o caminho da Plaza Espanya. Todos desceram de forma ordeira as escadarias. Quem usou o metrô, encontrou a estação superlotada. Mas todos esperaram a sua vez. Com um três a cada três minutos, a vazão foi rápida. Uma hora depois, eu estava em casa. Sem estresse algum, sem congestionamento e com um banquete de futebol na memória. Meu sorriso contrastava com a cara amarrada dos barcelonistas. Mas eles que se entendam com o Mick.