
Aos 42 anos, Marcelo Gallardo é hoje o grande nome do River Plate. São quatro anos e oito títulos no clube nesta sua terceira era. As duas primeiras foram como jogador, nos anos 1990 e 2000. Também pontuadas por títulos. Gallardo é um dos quatro argentinos que ganharam a Libertadores como jogador e técnico por um mesmo clube – o quinto é o ex-goleiro Nery Pupido, que venceu pelo River no campo e com o Olimpia fora dele. Napoleón, como é chamado pela torcida, acaba de renovar o contrato até 2021. Se cumpri-lo até o final, serão oito anos à frente do clube em que cresceu e virou jogador. A tendência é de que isso não aconteça. Na Europa, o nome de Gallardo já soa com força. Os boatos aumentaram depois de uma resposta enigmática na entrevista coletiva da semana passada, em que lembrou que nada é eterno. A seguir, conheça em sete toques a versão portenha de Renato Portaluppi e que estará diante do Grêmio nesta busca por vaga na final.
El Napoleón
O apelido vem de longe, de 2003. Mas só pegou agora, na fase de grandes conquistas com o River. Gallardo foi chamado pela primeira vez de Napoleón em 2003, por obra do narrado Atilio Costa Febre, o Lito, a voz do River Plate no rádio portenho e hoje narrador da Rivadávia. Lito se encantou com os dois gols e atuação demolidora no 3 a 1 sobre o São Paulo, no Monumental de Núñez, pela Copa Sul-Americana. Na descrição do primeiro gol, descreveu assim: "Voltou o organizador, voltou o futebol, voltou sem dúvida, sem medo, sem temores. Voltou Gallardo, o Napoleão, o grande estrategista". Gallardo era o meia e principal referência técnica do time. Pela estatura, pelo biotipo atarracado e pelo cabelo armado, alisado de forma artificial força, Gallardo era conhecido como como "Muñeco" (boneco, na tradução). O "Napoleón" ficou guardado até ele virar o grande líder da retomada do River. Caiu como uma luva. Tanto que hoje poucos se referem a ele como "Muñeco".
Vida no River
Gallardo chegou ao River Plate ainda adolescente. Fo descoberto por olheiros do clube quando dominava o meio-campo do Estrella de Maldonado, o clube do bairro El Mosquito, numa região carente de Merlo, distrito da região metropolitana de Buenos Aires e a 45 quilômetros do Monumental de Núñez. Em 1993, aos 16 anos, foi lançado no time principal por Daniel Passarela. Era um fiapo, com apenas 55 quilos distribuídos em 1m70cm. Mas escapava das botinadas com habilidade. Quando era impossível evitá-las, encarava com bravura. No ano seguinte, cavou um lugar em uma equipe que tinha Ortega, a joia da hora, e Francescoli, de volta depois de temporadas na França. Aos 18 anos, Gallardo ganhou o Argentino. Com 20, a Libertadores. Com 21, em 1997, ergueu a Supercopa, espécie de Sul-Americana da época, em um ano no qual o River ganhou também o Apertura e o Clausura. Dali, foi para o Monaco. Em 2000, ajudou o clube a ganhar o título francês. Voltou ao River mais duas vezes como jogador, entre 2003 e 2006, e na temporada 2009/2010. Em junho de 2014, regressou ao clube como técnico.
Taças e Copas
Gallardo voltou ao River Plate para encerrar uma seca de 17 anos do clube sem conquistas internacionais. Por coincidência, ele era um dos grandes nomes do time na conquista da Supercopa de 1997 - ao lado de Ayala, Sorín, Placente, Francescoli e Marcelo Salas. Seis meses depois de assumir como técnico do clube do coração, levou-o à conquista da Sul-Americana - na final, venceu o Nacional-COL. Depois disso, Gallardo engatou conquistas. A principal delas, a Libertadores 2015. Ao todo, são oito títulos com o River (tem duas Copas Argentinas, duas Recopas e duas Suruga Cup). A carreira de técnico é recente e pontuada por taças. Gallardo se aposentou em 2011, no Nacional-URU. Assumiu o time no mesmo ano e conquistou o título uruguaio. Saiu no final de 2012 e passou quase dois anos sem trabalhar. Até receber o chamado do River.
D'Alessandro

Em entrevista recente à ESPN, D'Alessandro revelou que muitas vezes ficava de gandula nos jogos do River para ver Gallardo de perto. Era um dos seus ídolos. Em 2004, os dois atuaram juntos e conquistaram o Clausura, o último título de Gallardo como jogador pelo River. O time era uma mescla de gerações de ídolos em Núñez. Os mais velhos, como Ortega, e uma turma nova que daria muito o que falar, como Cavenaghi, D´Alessandro, Aimar, Saviola, Mascherano, Lucho González, Lux (hoje goleiro reserva do time) e Eduardo Coudet, atual técnico do River Plate. Em 2015, D'Alessandro voltou ao River e ajudou Gallardo a conquistar a Copa Argentina.
Biografia

Gallardo repetiu com o River o feito de Humberto Maschio com o Racing e Roberto Ferreiro e Omar Pastoriza com o Independiente. Isso foi entre as décadas de 1960 e 1980. Depois disso, nunca mais ninguém levou a Copa pelo mesmo clube como jogador e técnico. Por isso, sua história virou uma biografia. Lançado no final de 2015, Gallardo Monumental - Vida, Pensamento e Método de um Líder nasceu a partir de um relato do próprio personagem ao jornalista Diego Borinsky. São 488 páginas em que Gallardo está exposto e aberto, contrariando sua timidez reconhecida. Além das ideias do técnico, o livro também traz passagens da vida de um jogador que disputou duas Copas do Mundo (1998 e 2002) e com rodagem pela França (Monaco e PSG) e alguns meses no DC United, dos EUA.
Xavi
Gallardo renovou contrato com o River até 2021. O plano do clube é vê-lo capitanear um projeto de reativação das categorias de base. Uma ideia que partiu do próprio técnico. O estalo veio no final de 2017, quando viu seu time perder por 2 a 1 para o Gimnasia-LP com 11 jogadores vindos de fora de Núñez. O que não acontecia desde 2 de junho de 1989. Gallardo sentou-se à mesa com o presidente Rodolfo D'Onófrio e desenhou o plano de reativar o forno de craques. É essa meta que o segura no River, apesar do assédio da AFA para que comande a seleção argentina e do Monaco para que volte com a missão de resgatar o clube das últimas posições na França. A fama de Gallardo já atravessou o oceano. Ou os oceanos. Em entrevista à Rádio Trinidad, da província argentina de Santa Fé, Xavi, desde o Catar, se disse admirador de Gallardo desde os tempos de jogador e foi além: o argentino teria o estilo do Barcelona.
Moderno e autêntico
O futebol do River de Gallardo é intenso, com alta pressão e marcação forte, com o maior número possível de jogadores sufocando o rival que estiver com a bola. É rotina entre os jornalistas que cobrem o clube surpresas nas escalações. Como os três centroavantes usados contra o Independiente. Segundo Pablo Chiapettta, setorista do River para o jornal Olé, do meio para trás o time pode ser citado de cor. Do meio para a frente, no entanto, são oito ou nove titulares. Ao mesmo tempo em que prega um futebol moderno, Gallardo é apegado às raízes. Matías Biscay, seu auxiliar, é um companheiro de longa data. Se conhecem desde os infantis do River. Os filhos, em grandes jogos, costumam ficar de gandulas. Na final da Sul-Americana 2014, foi Nahuel, hoje lateral-esquerdo reserva do River. Contra o Independiente, na quartas de final, foi Matías, que também joga no River, mas nos infantis. Antes dos jogos e ao final, nas comemorações, os abraços são sempre demorados.