Em uma tarde da primavera de 1984, entusiasmados produtores rurais encheram o estádio Beira-Rio, em Porto Alegre. O Brasil vivia o processo de redemocratização. Entre 35 mil e 40 mil homens e mulheres protestaram contra a política agrícola do governo de João Figueiredo, o último dos presidentes militares. A capa de Zero Hora estampou a foto das arquibancadas lotadas em um dia sem jogo do Inter.
Coordenado pela Fecotrigo, O Grito do Campo contou com apoio de dezenas de cooperativas, políticos e outras federações de trabalhadores e empresários. Em nota publicada nos jornais para convocar o protesto, a entidade reclamava do descaso de autoridades federais com problemas da produção de alimentos, citando "altos custos e falta de política agrícola coerente".
De acordo com a reportagem de Zero Hora, mais de 500 ônibus vieram de várias regiões do Estado. Os agricultores carregavam sacos de laranja, bebidas, galinhas com farofa, queijo, salame, pães e outros produtos para as refeições dentro ou no entorno do estádio. Em muitos casos, pela primeira vez, viam os grandes prédios de Porto Alegre.
O protesto teve discursos políticos e apresentações artísticas. As vaias a dois deputados federais do PDS e à leitura de mensagem enviada por Paulo Maluf, candidato à presidência da República, revelaram o tom oposicionista no Beira-Rio. O candidato da Aliança Democrática, Tancredo Neves, que seria o eleito pelo Colégio Eleitoral, participou do evento. No discurso, defendeu reforma agrária e subsídios para produtores.
A Federação das Cooperativas Tritícolas do Rio Grande do Sul (Fecotrigo) foi incorporada pela Federação das Cooperativas Agropecuárias do Rio Grande do Sul (FecoAgro/RS). Nos últimos 40 anos, inúmeros protestos de agricultores ocorreram em Porto Alegre, mas aquele, em 2 de outubro de 1984, ficou marcado pelo momento político, local e tamanho da mobilização.