Em cenário de hiperinflação e desemprego, o presidente Itamar Franco apostou em incentivo à indústria automobilística em 1993. O foco estava na geração de empregos e oferta de um carro popular, com preços mais acessíveis. O primeiro acordo foi firmado com a Autolatina (antiga joint venture entre Ford e Volkswagen) para a volta do Fusca. O governo federal ofereceu incentivo fiscal, reduzindo para 0,1% a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
O Palácio do Planalto estabeleceu cotas de produção, com compromisso de contratação de novos trabalhadores. O preço do carro popular não poderia superar US$ 7 mil. O decreto estabelecia mínimo de 90% de componentes de fabricação nacional.
Pelo acerto feito em 5 de fevereiro de 1993, a Autolatina prometeu abrir 800 empregos diretos em São Bernardo do Campo, em São Paulo. O Fusca estava fora de produção desde 1986. Com a repercussão do anúncio, General Motors (GM) e Fiat exigiram o mesmo tratamento tributário.
Poucos dias depois do anúncio da volta do Fusca, a Fiat assinou protocolo de intenções para gerar mil empregos e produzir, naquele ano, 60 mil unidades da nova versão do Uno, o Mille Eletronic, motor 1.0. Em março, a GM anunciou o Chevette L, o seu carro popular.
O carro popular não era não popular. Em 23 de agosto de 1993, no relançamento do Fusca, Itamar Franco criticou o preço e disse que só poderia comprá-lo em três prestações. O Fusca chegou ao mercado custando Cr$ 600 mil, o que correspondia a 108 salários mínimos daquele mês.
O Brasil trocou a moeda de Cruzeiro para Cruzeiro Real em agosto de 1993, um ano que acumulou inflação acima de 2.000%. Os preços e o salário mínimo mudavam todos os meses, o que dificulta a comparação dos valores com os automóveis oferecidos hoje pelas montadoras. O dólar era referência, mas não podemos simplesmente aplicar o câmbio de hoje no preço dolarizado daquela época, já que os Estados Unidos também acumularam inflação em 30 anos. Diante deste cenário, busquei a comparação dos preços da época ao poder de compra dos brasileiros, considerando o salário mínimo.
Em outubro de 1993, o Mille Eletronic 1.0, na versão básica de duas portas, era vendido por Cr$ 1,085 milhão, equivalente a 90 salários mínimos. A Fiat oferecia 13 opcionais, que somavam mais Cr$ 427 mil. Só o ar-condicionado elevava em Cr$ 225 mil o valor do carro.
A política de incentivo aqueceu a indústria automobilística. Em 1993, foram comprados 1,061 milhão de carros nacionais novos, um recorde. Em outubro de 1994, os carros populares representavam 52% das vendas totais no Brasil. Nove modelos estavam no programa federal do carro popular. Outros modelos, fora do programa, pagavam 25% ou 30% de IPI.
Em 1995, o governo decidiu elevar o IPI dos populares e os preços subiram. Em fevereiro de 1995, por exemplo, o Corsa Wind 1.0 custava de R$ 11,5 mil e R$ 13 mil, de 164 a 185 salários mínimos.
Depois de 30 anos, o governo federal prepara anúncio de novo incentivo ao carro popular. Não é a volta do Fusca, mas uma tentativa para baratear os automóveis.