Presenciar a quebra de um recorde e o nascimento de uma nova marca histórica é um momento singular dos Jogos Olímpicos. É o instante da vibração máxima do atleta, de esplendor do público, de olhos do mundo inteiro admirados por um novo feito. É o 10 de Nadia Comaneci. O show de Bolt no Ninho do Pássaro. Feitos. O planeta para para aplaudir.
Na Olimpíada de Paris, antes mesmo de os jogos começarem, já havia um feito a ser celebrado. E é sobre ele que quero falar. Pela primeira vez, em 33 edições dos Jogos, temos o mesmo número de homens e mulheres atletas nas disputas esportivas. No caso do Brasil, outro marco. É a primeira vez que o país leva mais atletas mulheres do que homens nas competições.
E por que isso é importante?
Pela primeira vez, temos o mesmo número de homens e mulheres atletas
Menos pela condição numérica e mais pelo que esta fotografia tem a dizer à sociedade. Ter mulheres ocupando espaços antes percebidos como exclusivamente masculinos mostra a milhões de meninos e meninas que lugar de mulher é, sim, onde ela quiser. É abrir portas. É desbravar caminhos. É mostrar às pequenas que elas podem jogar futebol, podem andar de skate, podem escolher os rumos da própria vida. E isso é bom para todos.
Aliás, a máxima olímpica deveria servir a todas as áreas. Para o esporte, para o mercado de trabalho, para a política, para os espaços de poder, onde ainda penamos tanto.
No contexto político, para citar um exemplo, os números são péssimos no Brasil. Na Câmara dos Deputados, 91 mulheres eleitas frente a 422 homens – número que não chega a 20% do total (2022). Se fizermos o recorte municipal, é ainda pior: na última eleição (2020), prefeitas eleitas somaram 12,1%; vereadoras, 16%. Os dados mostram o quanto ainda precisamos avançar.
Mas voltemos à Olimpíada. A presença de mulheres, para além da inspiração social, traz um avanço grande do ponto de vista prático, com olhar atento para temas ainda ignorados pelos homens (lamentavelmente). Foi pela pressão e exigência de atletas como a judoca francesa Clarisse Agbegnenou, mãe da pequena Athena, que a organização da Olimpíada passou a disponibilizar espaços para amamentação em 2024.
Parece pouco? Não. É histórico. Basta lembrar que há três anos, em Tóquio, a atleta Ona Carbonell, nadadora e recordista de medalhas em mundiais da modalidade, foi às redes sociais se dizer decepcionada, impedida de levar seu bebê para perto de si a fim de amamentá-lo.