É inacreditável que em 2024 nós, mulheres, ainda precisemos gastar preciosas horas do nosso dia para ensinar homens, adultos funcionais, sobre não tocar em nossos corpos sem nossa autorização. Uma mão, um braço, um beijo sem nosso consentimento, tudo isto já está tipificado na legislação como "importunação sexual" e, portanto, não pode e não deve ser praticado por quem quer que seja. No mais recente capítulo, a importunação foi praticada pelo indivíduo que interpretava o Saci, mascote do Internacional, no clássico Gre-Nal.
A delegada Cristiane Ramos, que comanda a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam), falou sobre o episódio no programa Timeline, da Rádio Gaúcha. Com a conclusão do inquérito, o homem foi indiciado pela Polícia Civil justamente por importunação sexual.
A delegada narrou, com base nos depoimentos que ouviu e nas imagens do estádio Beira-Rio, que foi absolutamente diferente a importunação praticada pelo homem quando comparados os movimentos direcionados a repórteres homens e à repórter mulher. Para os homens, pequenos chutes, empurrões. No caso da repórter, um beijo.
Aí reside exatamente o machismo que tanto reclamamos e, ao que parece, falamos grego. O fato de sermos mulheres, na visão de parte significativa da sociedade, lhes dá direito de tocar nossos corpos sem nossa autorização. O que passa na cabeça do indivíduo que aproxima a boca de uma profissional, que está trabalhando, durante a partida? Quem lhe deu esse direito?
— No caso dos homens, ele incomodava de maneira diferente, dando chutinho nos pés, dando pequenos empurrões. Enfim, importunando. Em relação à repórter, o que é possível ver nas imagens: ela vinha sendo incomodada por ele, no momento da cobrança do pênalti, ele ergueu a máscara, ela já incomodada, não queria ficar perto dele. Então, ela saiu e foi para outro canto. No momento do gol, ele desvia dos outros profissionais e vai nela, dá um beijo nela, à força. A boca dele não é coberta pela máscara. É um tecido bem fino, a máscara, a esponja começa acima do nariz. Tem só um tecido fino. A vítima sentiu o beijo. E ele não nega que beijou a vítima — explicou.
Além da repórter, uma torcedora do Sport Club Internacional relatou à polícia ter sido importunada pelo mesmo homem. Ela foi tocada, sem consentimento, quando pediu para tirar uma foto com o mascote. Acompanhada do noivo, a mulher acabou tendo uma crise de ansiedade depois do ocorrido. Segundo a delegada, a vítima sentiu-se mal, começou a tremer e teve uma crise de choro. Foi embora sem nem mesmo assistir à partida.
— É isso que acontece com uma mulher quando ela sofre importunação sexual. As mulheres ficam num estado lastimável, as mulheres não conseguem reagir naquele momento. Então a gente tem que acolher, sim, tem que estender a mão. Estamos falando de machismo e de violência contra mulheres, independente de time. São duas mulheres, de clubes diferentes, uma que estava trabalhando e uma que foi ao estádio para torcer e precisou sair, saiu sem nem mesmo assistir ao jogo — concluiu.
No caso da torcedora, ela também contou à polícia ter sido segurada à força pelo homem e ouvido uma frase de conotação sexual, afirmando que "se sentia como um adolescente na puberdade ao lado dela". Inacreditável. Inaceitável. Apenas parem.
Assista ao programa Timeline desta quinta-feira (14).