Se houve algo que Olavo de Carvalho, professor e guru bolsonarista que morreu na segunda-feira (24), compreendeu como poucos é o método de fazer, nos últimos anos, eclodir suas ideias, vídeos e provocações através de uma sociedade forjada em smartphones, comunidades virtuais e redes sociais.
O professor Olavo tinha uma compreensão com a qual eu e você podemos concordar (ou não) a respeito da sociedade ao longo dos séculos: a de que a esquerda (ou algo que ele classificou como comunismo) havia dominado o mundo através do campo das ideias, ocupando instituições como universidades, sindicatos, a mídia, etc. Nessa lógica de pensamento, os "esquerdistas" se espalharam com seus ideais, a partir de uma guerra cultural e não mais de aspecto militar.
Para combater esta estratégia, o professor passou a incentivar que os intelectuais da direita tomassem, também, esses espaços (mídia, universidades, etc) a fim de acabar com o tal "mal do comunismo".
Até aqui, entendo, Olavo pode ou não ter razão, a depender de quem estiver lendo esse texto. Não pretendo me debruçar sobre esse tema para o qual talvez fossem necessários artigos muito mais complexos (e extensos, por suposto).
O que quero observar é que Olavo de Carvalho compreendeu que, em tempos de engajamento e de algoritmo como catalisador de disseminação ideias, e de uma sociedade absolutamente hipnotizada por redes sociais, o ódio e os palavrões valem (muito) mais do que dezenas de linhas de artigos científicos embasados. No podcast Retrato Narrado, a jornalista Letícia Duarte produziu um episódio bônus aos capítulos realizados pela excelente Carol Pires (se você não ouviu, corra!) em que é possível compreender um pouco desta lógica.
Dentro dessa perspectiva, é menos eficiente discutir problemas reais da sociedade com argumentos, apresentando ponto e contraponto. O professor, por exemplo, vociferava contra ideias progressistas com palavrões, termos pejorativos e discursos para aniquilar adversários, com expressões absolutamente não republicanas.
A jornalista especialista em cidadania digital Madeleine Lacsko, que se aprofundou sobre as relações humanas a partir das redes e seus algoritmos, costuma dizer que o ódio engaja mais que "mulher pelada", para se ter uma ideia do tamanho do estrondo capaz de ser produzido a partir das discussões e palavrões na internet.
Não chega a ser novidade observar tal comportamento nas manifestações do professor. Ao TAB UOL, em 2020, o jornalista Denis Burgoerman, que escreveu uma reportagem sobre o curso de filosofia ministrado por Olavo, contou ter ouvido mais de uma vez uma recomendação olavista aos alunos: "Não puxe discussão de ideias. Investigue uma sacanagem do sujeito e destrua-o". É sobre isto que estamos falando.
E, sem falsa simetria, não ignoraremos o fato de que apoiadores de Olavo pensam que o ódio e a destruição partem justamente do campo contrário ao seu, da esquerda e dos progressistas. Sobre isto, cabe a leitura de "O Progressista do Amanhã", de Mark Lila, um democrata que propõe a reflexão sobre a propagação das pautas identitárias, com a ponderação de: afinal, que sociedade pretendemos construir se passarmos a calar, silenciar e cancelar todos aqueles que não compactuam com as ideias que entendemos corretas e civilizadas?
Onde vamos parar com tanto ódio? É difícil saber. Nos últimos dias, sobrou até para os participantes do Big Brother Brasil foram criticados por serem "good vibes" demais.