Negar a realidade com base nas próprias convicções é um erro clássico que ficou ainda mais perigoso diante da consolidação das redes sociais. Eu penso desta maneira e a bolha que vivo na internet corrobora o que eu penso. Portanto, minha perspectiva condiz com a verdade.
É sob essa premissa que a análise sobre as manifestações do Sete de Setembro, favoráveis a Jair Bolsonaro, pode se demonstrar míope.
Primeiro, é importante esclarecer: ninguém aqui está aplaudindo discurso golpista ou atenuando falas que sugerem o descumprimento de ordens judiciais. Mas, antes, convidando para uma análise divergente da majoritária, que — por convicção ou ignorância — optou por desqualificar os manifestantes desta terça-feira como "poucas pessoas" ou um "grupo de radicais".
Havia radicais? Por suposto que sim. Mas houve também, em Porto Alegre, quem vestisse uma capa de chuva para demonstrar apoio a um presidente que se coloca como defensor de pautas conservadoras e de resgate da família e de valores cristãos.
Em São Paulo, aliás, os pastores evangélicos vestiram verde e amarelo e subiram no trio elétrico ao lado de Bolsonaro. Desprezar a presença de evangélicos na sociedade brasileira é passo certo em direção ao erro. Não à toa Lula está com o bloco na rua tentando recompor laços para 2022.
Aqui é importante desfazer-se de vieses inconscientes para seguir compreendendo o que está em jogo no xadrez político. Como observou Anna Virginia Balloussier na Folha, os pastores justificam o apoio a Bolsonaro com diferentes argumentos, entre eles o fato de se dizerem enganados pelo PT, que intensificou a defesa de pautas identitárias (LGBTs, feminismo, etc).
O doutor e mestre em Sociologia, ex-deputado e absolutamente não-bolsonarista, Marcos Rolim, desenhou: "Comentaristas seguem com o mantra de que Bolsonaro está 'isolado', outros dizendo que 'flopou'. Como tenho dito, isso só se sustenta quando se reduz a política à institucionalidade. Trata-se de uma visão ingênua que não percebe o que está ocorrendo".
Rolim atenta ainda para a gravidade de minimizar a manifestação, sob outro ponto de vista: o de não perceber que tal relativização pode tapar a realidade quanto a arroubos antidemocráticos: "Chega às raias do negacionismo não perceber que esse dia 7 materializou a mais grave ameaça de nossa história".
Se a força de Bolsonaro junto aos seus será suficiente para reelegê-lo, aí são outros quinhentos. Mas diminuir as manifestações pró-Bolsonaro não parece o melhor caminho para quem pretende chegar vivo às eleições do ano que vem.