Ignorando convenientemente as investigações sobre o ministro do Turismo, as denúncias que envolvem cheques na conta da primeira-dama e o fato de um ex-assessor investigado por rachadinha ter sido encontrado pela Polícia Federal escondido na casa do advogado da família dele, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que a corrupção acabou no seu governo. Elogiando a própria gestão, voltou a criar animosidade com a imprensa e bradou a frase que entra para o anedotário político:
- Eu acabei com a Lava Jato - anunciou nesta quarta-feira.
Segundo o presidente, o fim da Lava-Jato se deve ao fato de não haver mais corrupção a ser investigada, em nível federal. Isto mesmo. Não há mais corrupção a ser investigada (!). Como num grande acordo nacional.
Curioso é que também não houve qualquer menção de Bolsonaro à suposta interferência dele no comando da PF, apontada com preocupação por seu ex-ministro Sergio Moro, nada menos que o ex-juiz responsável por aquela que é considerada a maior operação de combate à corrupção da história recente do país.
O tema, aliás, estará no centro do plenário do STF nesta quinta-feira (8), quando ministros decidirão se o presidente poderá depor por escrito ou terá que explicar pessoalmente a mudança no comando da instituição que gerou a demissão do ex-pupilo. A se julgar pelos últimos encontros de Bolsonaro - incluindo pizza na casa de Dias Toffoli - já dá pra imaginar o que vem por aí no cardápio.
Não dá pra dizer que foi por falta de aviso. Para quem imaginou que Bolsonaro - político com anos de mandato em Brasília e com uma família inteira envolta no Poder - expressava a condição de agente anti-establishment sobrou desinformação ou ingenuidade. As movimentações em dinheiro vivo apontadas pelas autoridades pouco tem a ver com o desapreço pelo sistema bancário e muito com transações suspeitas que precisam ser explicadas. E mais, presidente, por que sua esposa Michelle Bolsonaro recebeu R$ 89 mil de Fabrício Queiroz?
Não, caro leitor, a corrupção não acabou. E não fortalecer as instituições que ajudam a combatê-la fala muito sobre os interesses do atual governo. Ao escolher um procurador-geral desalinhado com a Lava-Jato, indicar ao STF um ministro celebrado por Renan Calheiros e fritar Sergio Moro, que pediu demissão por desalinho com as práticas do Executivo, Bolsonaro deu provas de que sua preocupação de longe é investigar malfeitos. O grande acordo nacional, previsto outrora por Romero Jucá, está mais vivo do que nunca. Com o Supremo, com tudo.