"É uma emoção tão grande, eu não encontro palavras, te juro, para dizer neste momento. É um momento tão grande, eu fico em lágrimas, perdão, eu fico emocionada", confessou, comovida, a cantora carioca Elza Soares à coluna ao descrever seus sentimentos sobre a honraria com a qual será agraciada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) no próximo domingo, dia 26. Elza Gomes da Conceição, nome de batismo da artista, nascida em 1937, receberá o título de doutora honoris causa da instituição. Ela se apresentará no Bar Opinião, em Porto Alegre no sábado, na véspera da cerimônia.
— É um filme, como você falou, passa um filme na cabeça — dividiu.
Elza disse que esse filme que lhe passa, da trajetória de sua vida, a faz perceber que "tudo valeu a pena. A UFRGS, aliás, observou isso ao justificar a escolha do nome da cantora carioca. Destacou o fato de ser "uma cantora sem precedentes em nosso país" e sua origem humilde: Elza é filha de um operário e de uma lavadeira, criada em Água Santa (hoje Vila Vintém), uma das primeiras favelas do Rio de Janeiro.
— Valeu a teimosia, bater pé, eu quero isso, eu vou fazer isso. Eu tinha tudo para não dar certo, tudo, mas eu falei vai dar certo, sim. Vai dar certo porque eu estou fazendo isso com honestidade. Desde criança, eu venho buscando isso. Buscando Deus pra mim. E Deus que, para mim, é uma mulher. Por que só ele consegue ser tão piedoso, tão compassivo. E eu nessa luta buscando meu direito de viver como um ser humano normal. Assim como eu quero ser um ser humano normal, eu acho que todas as mulheres têm esse direito. Principalmente as mulheres negras, coitadas, que sabem o sacrifício delas. Quando a gente chega num lugar é com muito sacrifício, sangrando. Como eu digo sempre, a gente já nasce sangrando. É uma luta — explicou.
Ouça a entrevista aqui:
Ao reconhecer que sua luta e seu sacrifício valeram a pena, Elza Soares lembrou também a luta de outras mulheres e destacou ainda a luta de professores e educadores. Sem citar diretamente às manifestações de 15 de maio, quando estudantes foram às ruas protestar contra o contingenciamento de verbas aplicado pelo governo Bolsonaro, Elza disse que é "terrível" ter que ficar "mendigando" educação;
— Eu tenho uma luta muito grande. Eu tenho coluna operada e, por isso, canto sentada. Se hoje eu estou aqui, buscando essa força para as mulheres, buscando forças para aquelas que são fracas, agradeço a minha professora, aos meus professores. A minha luta também é pelos professores. Que absurdo esse descaso com o professorado, que dão aquilo que você tem: a educação. A educação vem com papai e mamãe em casa, mas você completa na escola. Eu estudei em escola pública. Os professores estão renegados. A minha luta também é por isso. É um gritar pela educação. Isso não existe. Um país educado é a maior coisa do mundo. E a gente tem que ficar mendigando educação. É terrível — disse.
Elza ainda contou com carinho sobre a relação com o cantor e compositor gaúcho Lupicínio Rodrigues, que morreu em agosto de 1974.
— Meu primeiro grande show foi feito aí em Porto Alegre. Meu primeiro show, meu primeiro cachê foi ganho em Porto Alegre. E graças a um homem que amo, Lupicínio Rodrigues. Tinha aí um bondinho, uma praça, que era um palco e a gente cantava nele. Acho que todo mundo em Porto Alegre deve lembrar desse bondinho. Foi um sucesso. Todos os grandes artistas passavam por ele. O Lupi foi tão gentil, tão generoso, que nesse dia ele foi para cozinha, fez um churrasco pra mim, uma farofa pra mim, coisa que eu nunca tinha comido: churrasco com farofa. E ele fez, uma coisa de louco. Esse homem estava no meu coração. Obrigada Porto Alegre. Obrigada, povo gaúcho. Obrigada, Lupi — descreveu.