Ana Medeiros dança com a alma. O olhar, a cadência, o bailado, tudo ali é ancestralidade, mas há algo mais na arte da bailarina chamada La Negra: o orgulho incontido de ser quem é e das barreiras que venceu para chegar onde chegou.
Já escrevi sobre ela e volto ao tema, porque Ana — ícone do flamenco negro no Brasil —está prestes a subir no palco outra vez com o espetáculo de mesmo nome, que a consagrou vencedora do Troféu Açorianos 2021. Será nos dias 17 e 18 de julho, com entrada franca, no teatro da Reitoria da UFRGS, na Capital (leia mais detalhes no fim do texto).
Nascida em Porto Alegre, a artista perdeu a mãe ainda menina. Jamais esqueceu o som das castanholas vibrando nas mãos maternas. Anos mais tarde, voltou a ouvir o tilintar mágico do instrumento ao passar em frente à escola da coreógrafa Cadica Costa. Entrou e, mesmo sem dinheiro, ficou. Nunca mais deixou o tablado.
Entre ensaios, apresentações e novas parcerias, formou-se arquiteta. Não ergueu casas, mas seguiu concretizando sonhos. A partir de 2017, iniciou carreira solo, fundou a própria companhia de artes na Capital e deu asas a um estilo só seu — a começar pelo cabelo crespo e retinto que, enfim, parou de esconder. Foi o suficiente para que ela conhecesse a face brutal e dura do racismo.
— Ali que entendi, de fato, do que é o preconceito e o que significa ser uma negra no flamenco — recorda Ana.
Ela respondeu à discriminação com talento, cabeça erguida e dedicação. Tornou-se a primeira concertista de castanholas a gravar um álbum no Rio Grande do Sul, acolheu bailarinas pretas no seu grupo, reverberou a luta antirracista em suas criações e empilhou prêmios.
Agora, prepara o retorno aos palcos. La Negra segue voando.
"Flamenco Negro"
Nos dias 17 e 18 de julho, o teatro da Reitoria da UFRGS recebe para três sessões gratuitas o espetáculo Flamenco Negro, da Cia de Arte La Negra Ana Medeiros. O show conta com financiamento Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa por meio do Fumproarte.
No elenco, Ana Medeiros (La Negra), que também assina a direção-geral e a coreografia, Patrícia Correa La Paloma, Bianca Benevenuto La Señora, Mima Ruedas e Rose Correa, acompanhadas de Gabriela Vilanova na viola, todas artistas negras.
Flamenco Negro trata de temas como a influência e a diáspora negras presentes no flamenco, lançando luzes sobre a contribuição afro para a arte tanto no Brasil quanto na Espanha.
Nos dois dias o público poderá conferir uma performance do coletivo Corpo Negro e Ballet da UFRGS, sob direção geral de Lisete Arnizaut de Vargas e direção artística de Lisete Arnizaut de Vargas e Cibele Sastre, que abre a programação das sessões, e a participação especial da turma de bolsistas negras da Cia de Arte La Negra Ana Medeiros.
Na quarta-feira, 17 de julho, a performance inicia às 20h; já no dia 18 é possível conferir o espetáculo às 15h (sessão para escolas e ONGs) e às 20h (com intérprete de Libras), sempre com entrada franca. Mais informações, aqui.