Na próxima segunda-feira, completam-se 50 anos da final do 2º Festival da Música Popular Brasileira, o que consagrou as canções A banda, de Chico Buarque, e Disparada, de Geraldo Vandré e Theo de Barros, e foi assistido por todo o país em transmissão da TV Record de São Paulo. Para mim, aquele foi o momento inicial de fundação da chamada MPB, gênero/sigla que não havia antes e predominaria no restante do século 20 – de certa forma, ainda predomina. Na verdade, antes ocorreram as duas edições do festival realizado pela TV Excelsior, também de São Paulo, nas quais estrearam Chico, Vandré, Caetano Veloso, Gilberto Gil e, entre outros, Edu Lobo, autor, com Vinicius de Moraes, de Arrastão, a música que catapultou Elis Regina ao estrelato. As revelações de tantos bons compositores novos e o grande sucesso de Elis foram determinantes para que a Record investisse pesado na música em sua programação.
O festival de 1966 comprovou o acerto dessa política. Depois das apresentações de Disparada, com Jair Rodrigues, na primeira eliminatória, e de A banda, com Chico e Nara Leão na segunda, formaram-se duas torcidas apaixonadas. O festival e essas candidatas era o assunto de literalmente todas as rodas, levando plateias inflamadas ao Teatro Record e, pelo Brasil, reunindo telespectadores em todas as casas. No Rio Grande do Sul, a TV Gaúcha (futura RBS TV) retransmitia a programação da Record. Assisti ao festival na casa de uma namorada e também me dividi. A banda era linda, cativante, tinha uma letra aparentemente saudosista mas era jovem (sem ser Jovem Guarda), e uma semana antes da final tocava no rádio sem parar. E eu, estudante do Julinho me preparando para o vestibular, me identificava muito com o teor político, de protesto, de Disparada, cantada de forma exata, séria, por Jair Rodrigues.
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Qual venceria o festival? Havia forte pressão das torcidas. O júri de 12 integrantes estava dividido também. No definitivo livro A era dos festivais (Editora 34, 2003), o jornalista Zuza Homem de Mello – na época funcionário da Record – conta em detalhes o nervosismo dos bastidores na noite final. A banda vencera por 7 a 5. Ouvindo os boatos, Chico foi à direção do festival dizer que considerava Disparada musicalmente superior e que, se a vitória fosse dele, recusaria o prêmio em pleno palco. Outra reunião tensa decide pelo empate. As duas seriam vencedoras, para felicidade geral da nação. Com a distância do tempo, Zuza conclui que A banda não era uma obra-prima, e que Disparada, sim, "é uma obra-prima da música sertaneja, assim como Luar do sertão e poucas mais". O marco de fundação da moderna música brasileira se completaria na edição seguinte do Festival da Record, com o Tropicalismo de Caetano e Gil.
Foi um tempo em que a emissora de televisão líder de audiência tinha somente programas musicais no horário nobre. Depois, com a Globo, viria a "era das novelas".
Festa da Música começa domingo em Porto Alegre
Um concerto da Ospa Jovem, às 11h de domingo na Redenção, dará início à 12ª edição da Festa Nacional da Música, a primeira em Porto Alegre depois de 11 realizadas em Canela. Até o dia 19, a cidade terá painéis de debate e shows em vários locais, da Cinemateca Capitólio ao Anfiteatro Pôr do Sol, do Mercado Público ao Centro de Eventos do Plaza São Rafael. Idealizador da festa, o empresário Fernando Vieira diz que será a mais ousada de todas as edições pela abrangência da produção, que, além de mobilizar artistas gaúchos como nunca antes, manterá o "cardápio" de artistas nacionais de todos os gêneros e estilos, com dezenas de atrações.
Ainda neste domingo, às 14h, no palco ao lado do Monumento do Expedicionário, na Redenção, o show de abertura terá, entre outros, Luiz Carlos Borges, Serginho Moah, Antonio Villeroy, Neto Fagundes e Elton Saldanha. No mesmo local, quarta-feira, haverá um festival de bandas marciais. Dois dias depois, evocando os antigos Carnavais de Porto Alegre, integrantes das escolas Bambas da Orgia, Imperatriz Dona Leopoldina e Imperadores do Samba, mais a Banda da Saldanha, farão a “descida da Borges de Medeiros”. E por aí vai, com as atrações nacionais concentradas nos três últimos dias, quando também ocorrerá o "Gre-Nal dos Artistas".
Confira tudo em festanacionaldamusica.com.br.
ANTENA
ILHA
De Chama Violeta
Nomes como Naná Vasconcellos (1944 – 2016), Serginho Moah, Simoninha, Kako Xavier e Pingo Borel, entre outros, robustecem o primeiro álbum da banda porto-alegrense Chama Violeta, produzido por Edu Martins e dedicado a GibaGiba. Desde 2010 o sexteto liderado pelo compositor, cantor e violonista Chirú agrega cada vez mais público para sua música de luta, com ritmos de descendência afro, samba, maracatu, funk, reggae, e letras incisivas sobre a vida, o homem, a natureza. "Eu penso nas crianças magras criadas pelas calçadas/ Quem vai ser um cidadão?", diz a letra de Levante. Outra, A voz do Brasil, fala em negros e índios explorados. Já Sem marcação é sobre um menino favelado que se torna jogador de futebol. É um disco porrada, música de qualidade com a percussão sempre em cima. Fumproarte, R$ 20, nas livrarias Palmarinca e Bamboletras ou pelo e-mail produtoraoutros500@gmail.com e plataformas digitais.
SE O FUTURO PERMITIR
De Suco Elétrico
O terceiro álbum de estúdio da banda formada em Porto Alegre em 2000 é resumido por seu cantor, compositor e baterista, Alexandre Rauen, com a frase "trocamos as flores pelos cactos". Este disco é o primeiro sem a vocalista Dani Rauen, com Alexandre assumindo os vocais – decisivos para o resultado final. Faixas como Canção do futuro, Tênis, Dragão e Relógio mostram que a antiga psicodelia deu lugar a um rock pesado, urgente, com características do brit pop. Ásperas e bem construídas, as letras são cantadas com um efeito que praticamente dispensa o entendimento literal do conteúdo. K.C.O.Lino é um guitarrista energético, tem a medida exata da distorção, e Drunk Rodrigues o baixista que qualquer banda gostaria de ter. O novo baterista, Lucas Kinoshita, entrou no fim das gravações e aparece em uma só faixa. Produção de Marcelo Fruet. Independente, R$ 25, nas lojas Toca do disco e Classic Rock, em selo180.com e plataformas digitais.
TODAS ESSAS RUAS
De Estação do Tempo
Criada em 2012 em Novo Hamburgo, a banda Estação do Tempo não tem esse nome por acaso. Seus idealizadores, o aposentado Jaime Bruxel (guitarra, composições) e o comerciante Reis Oliveira (baixo) têm, respectivamente, 67 e 66 anos. A eles se uniram o advogado George Gradin (voz, violão, composições), 47, e o técnico em eletrônica Silmar Campos (bateria), caçula da turma. Teclados do produtor do disco, Gilberto Amaral, completam a trama. Bruxel tocou em bailes nos anos 1960, traz uma sonoridade que lembra Renato e seus Blue Caps, enquanto Gradin e Silmar chegam com influências de Ira! e Engenheiros do Hawaii. Como todos têm rock nas veias e querem se divertir, como as letras (a maioria sobre amores complicados) são bem feitas, o disco é uma surpresa pela absoluta sinceridade. E de sobra tem as participações de Rafael Malenotti e do Overdrive Duo. Independente, R$ 15, à venda no Facebook da banda.