O que espanta, na operação deflagrada nesta quarta-feira (17) por Polícia Federal e Receita Federal na fronteira com o Uruguai, não é a existência de lavagem de dinheiro. Há décadas essa ponta mais meridional do Brasil, no Rio Grande do Sul, é usada para esconder lucros indevidos. Sejam eles oriundo de crimes hediondos, como tráfico internacional de drogas e armas, ou de outras atividades complexas mas vistas como menos perigosas, tais como a sonegação fiscal.
Três fatos revelados pela operação dos federais são espantosos. O primeiro é o volume de dinheiro movimentado. São R$ 230 milhões, quase uma Mega Sena de fim de ano. Isso numa cidade minúscula, o Chuí. O segundo ponto é que essa quantia passou por mãos de 11 laranjas. Pessoas sem posses, mas cujos nomes (e contas bancárias) são usados para disfarçar a origem dos verdadeiros donos da montanha de grana.
A terceira surpresa justamente a origem do dinheiro. A investigação apurou que se trata de dinheiro do Comando Vermelho, a maior organização criminosa do Rio de Janeiro, também com tentáculos nacionais. Sobretudo nas fronteiras. Há décadas não se ouvia falar de sua presença no Rio Grande do Sul. É muito forte em Mato Grosso do Sul, na Amazônia e em alguns estados nordestinos.
É a comprovação de que na fronteira pouco mudam as coisas. Em 1997, os repórteres Carlos Wagner, Nilson Mariano e eu mostramos como o Uruguai tinha se transformado em paraíso fiscal para criminosos brasileiros de todos os matizes. Ganhamos um prêmio Esso, na época o mais prestigiado do país, mostrando técnicas de lavagem usadas no país vizinho, como as offshore (empresas usadas para importação, muitas vezes só para movimentar dinheiro, sem produto) e até uma mina de ouro que produzia quase nenhum minério, mas era usada para justificar investimentos milionários. O tempo passa, o tempo voa, mas a lavagem continua numa boa.