A primeira auditoria nacional sobre a vacinação contra a covid-19 no Brasil resultou na suspeita de que pelo menos 50 mil imunizações podem não ter seguido a lista de prioridades estabelecidas pelo governo federal. Conforme a Controladoria-Geral da União (CGU), das 10 milhões de doses de vacinas aplicadas até 10 de março, em pelo menos 50 mil casos há inconsistência relativa aos dados dos imunizados.
Em relação à idosos, por exemplo, foram identificadas pessoas vacinadas que se definiram como pertencentes a esse grupo prioritário, mas que, de acordo com informações do CPF, possuem menos de 60 anos. Já no âmbito dos profissionais de saúde, a auditoria da CGU identificou cidadãos vacinados que, a princípio, não trabalham na área, tampouco estão lotados em unidades relacionadas diretamente à área da saúde.
As inconsistências serão discutidas com o Ministério da Saúde para a adoção de providências junto aos Estados e municípios voltadas a evitar a ocorrência de novos desvios, bem como para o aprimoramento dos controles em relação à conformidade dos grupos prioritários.
A CGU destaca que a análise é feita por meio de cruzamento de dados de sistemas, sendo possível que situações, a priori indevidas, possam ser justificadas. A Controladoria também ressalta que todas as informações pessoais acessadas nessa fiscalização são protegidas por se tratar de informações sensíveis, relacionadas a dados de saúde das pessoas, o que impossibilita a divulgação da identidade dos vacinados de forma supostamente irregular.
A CGU informa ainda que pelo menos mil pessoas teriam utilizado a identidade de uma pessoa morta para conseguir a vacinação antecipada. Um caso assim está sob apuração da Polícia Civil em Passo Fundo (RS). Um adolescente, de 12 anos, familiar de pessoas que trabalham num lar de idosos, teria sido vacinado no lugar de um idoso já falecido. O caso ainda não está concluído.
O Ministério Público já identificou pelo menos 18 casos de fura-filas na vacinação no Rio Grande do Sul, dentre mais de 400 suspeitas recebidas. A recomendação é que os responsáveis sejam processados por improbidade administrativa.
Já a Polícia Civil apura suposta burla na ordem de vacinação por parte de servidores públicos em Alvorada e São Leopoldo, além de outros casos, na iniciativa privada, em Gramado, Piratini e Butiá, entre outros municípios gaúchos.
Há demora na conclusão das investigações porque muitas informações precisam ser fornecidas por autoridades que são investigadas (no caso de prefeituras que organizaram a vacinação), explica uma promotora ouvida pela reportagem.
Na auditoria foram analisados dados do SIPNI (Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações) e também de cruzamentos com outras bases oficiais. A CGU alerta que, apesar de o percentual de inconsistências ser pequeno (no máximo 0,5%), o desrespeito à ordem de vacinação dos grupos prioritários, além de grave desvio ético, poderá ocasionar a responsabilização administrativa ou judicial dos envolvidos.