Foi no final de janeiro que começaram a pipocar no Brasil — e no Rio Grande do Sul — relatos sobre pessoas que furam a fila de vacinação. O assunto foi abordado diversas vezes pela reportagem de GZH, inclusive por este colunista, que também é repórter.
O senso comum é de que, ante a avalanche de supostos fura-filas que postaram nas redes o momento em que receberam as doses, comprovar a ilegalidade seria fácil. Mas não é bem assim.
Curiosamente, até agora, são poucas as investigações concluídas pelo Ministério Público e pela Polícia Civil do RS. É que, na maioria dos casos, o envio de documentos necessários para concluir a apuração depende da boa vontade dos investigados, explica um experiente delegado.
Trocando em miúdos: grande parte das suspeitas é de que as prefeituras permitiram que servidores que não seriam prioridade fossem vacinados antes do pessoal da linha de frente (de hospitais e postos de saúde). OK. Só que, para comprovar isso no inquérito, o policial (ou promotor de Justiça) precisa da lista de todos os vacinados. Chamar os investigados, que via de regra alegam que eram prioridade… Muitas vezes os alvos protelam seus depoimentos. O poder público municipal protela o envio de informações. Aí a investigação avança com lentidão.
É o que aconteceu, por exemplo, em Alvorada, onde servidores de áreas administrativas teriam sido vacinados antes dos funcionários de hospitais e postos de saúde. Ainda faltam documentos.
Em Passo Fundo, onde um adolescente teria se passado por um idoso para conseguir vacina, o inquérito ainda não está fechado porque algumas informações ainda precisam ser repassadas pelos investigados e pelo poder público.
Existe ainda um dilema: ante a avalanche de suspeitas levantadas nas redes sociais, promotores e policiais fizeram uma peneira. A maioria dos casos é de pessoas do mesmo grupo de vacinação, o prioritário, mas que receberam um pouco antes de colegas que seriam da linha de frente contra a covid-19. Ou seja: seriam vacinados em dias, mas se anteciparam, resume uma integrante do MP. Esses casos são deixados para depois, porque seriam sem dolo, apenas ruído de comunicação. Até agora o Ministério Público mandou 17 procedimentos para possível ação judicial por improbidade administrativa.
— A prioridade é investigar quem furou a fila sabendo exatamente que deixaria outros sem vacina — sintetiza uma promotora de Justiça.
Em resumo, como em tudo no Brasil, a burocracia retarda o ritmo da investigação dos fura-filas.