Veio do menos midiático e mais silencioso núcleo da Lava-Jato o começo do desmanche da marca que virou sinônimo de combate à corrupção no Brasil. Sete procuradores da República que integram a força-tarefa da operação em São Paulo pediram para deixar essa função, em documento encaminhado à Procuradoria-Geral da República.
Eles argumentaram "incompatibilidades insolúveis" com a procuradora Viviane Martinez, que conta com a confiança do procurador-geral da República, Augusto Aras, e chefia o braço paulista do Ministério Público Federal.
A própria chefe da força-tarefa da Lava-Jato paulista, a veterana e prestigiada Janice Ascari, renunciou à função. E qual o motivo? Um ofício enviado ao Conselho Superior do Ministério Público detalha a briga.
Os sete procuradores tinham encaminhado à Justiça Federal sete pedidos de investigações contra ex-integrantes do governo do PSDB em São Paulo envolvidos em suspeitas de corrupção de 2006 a 2014. Entre eles, o governador da época, José Serra. O alvo principal é a construção do Rodoanel Sul, na capital paulista.
"Surpreendentemente, contudo, apesar de não ter feito qualquer objeção à época das trocas de minutas, a procuradora Viviane enviou um e-mail, em 12/06/2020, aos demais integrantes da força-tarefa, pedindo que as peças fossem recolhidas... e que a operação planejada fosse adiada", diz o ofício dos procuradores.
Viviane teria decidido adiar a operação por dois meses, alegando que "parte dos pedidos foi distribuída irregularmente". Ela teria comentado que era melhor esperar a criação da Unidade Nacional Anticorrupção (UNAC), estrutura que centralizaria as forças-tarefas em Brasília, sob o controle de Augusto Aras.
Os procuradores enxergam nisso uma manobra de Aras para torpedear a independência da Lava-Jato e pediram para sair. É o segundo revés da Lava-Jato em uma semana. O outro foi a saída do chefe da força-tarefa da operação no Paraná, Deltan Dallagnol, que deixou o cargo alegando problemas familiares. Ele vinha em rota de colisão com o procurador-geral Aras, que critica o que chama de "lava-jatismo" do MPF e diz que a Lava-Jato não pode ser maior do que o Ministério Público.
São rachas, causados por política e poder, num monólito que continua sendo a maior iniciativa contra crimes de colarinho branco no país.