A chegada do calor traz uma preocupação adicional aos produtores de leite, que devem estar atentos à manutenção do volume e qualidade do produto, além, claro, do conforto térmico dos animais. Uma cartilha com orientações aos produtores foi lançada pela primeira vez, neste ano, pelo Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do RS (Sindilat/RS) e pela Universidade de Passo Fundo (UPF).
— Os animais sofrem muito com essas variações climáticas e resulta naquilo que nós denominamos de estresse térmico, ou seja, ele sente muito essa questão e, consequentemente, irá apresentar, ao longo dos dias de intenso calor, várias alterações no seu metabolismo, na ingestão de matéria seca, e isso tudo colabora para problemas como redução na produção e (alteração) na composição do leite — descreve o professor Carlos Bondan, do curso de Medicina Veterinária da UPF, que participou da elaboração da cartilha.
O impacto se dá no metabolismo do animal. Sob estresse térmico, a vaca ocupa a maior parte do tempo ofegando, tentando regular sua temperatura, e consequentemente diminui o tempo destinado ao consumo de alimentos. Ingerindo menos nutrientes, há alterações nos sólidos totais do leite, conforme indicam estudos. Outra consequência é a diminuição na capacidade de defesa imunológica dos animais, o que implica em uma maior incidência de quadros infecciosos e doenças, como a mastite.
Bondan cita um exemplo comum ao verão gaúcho: sob uma temperatura de 32°C, com uma umidade relativa do ar acima de 90%, somados à ausência de sombra e de água, a diminuição de produtividade por animal pode chegar a 80%. Por isso, a cartilha lançada por Sindilat e UPF recomenda oferecer principalmente conforto e boa alimentação aos animais. Entre as técnicas indicadas estão ainda o uso de aspersores e ventiladores, acesso irrestrito à água e manejo de ordenha nos horários mais frescos do dia.
Sobre um possível impacto das mudanças climáticas no futuro da atividade leiteira, Bondan observa que isso é algo que deverá ser observado ao longo do tempo. De acordo com ele, o problema do estresse calórico sempre existiu, mas muitas vezes foi negligenciado por falta de diagnóstico:
— Hoje, produtores mais tecnificados, mais conhecedores da causa, se tornam mais preocupados com isso e trazem esses problemas para a academia. Esse efeito há muitos anos a gente conhece, mas ele tem se tornado cada vez mais visível diante dos produtores, da própria indústria, exatamente porque, a partir de agora, nós temos uma identificação, nós temos um diagnóstico.
Segundo o secretário executivo do Sindilat, Darlan Palharini, a discussão sobre a necessidade de uma cartilha surgiu dentro do grupo de qualidade criado pelo sindicato. As empresas deverão imprimir as orientações e enviar aos produtores junto com a nota do leite.
— A grande maioria dos produtores já sabe, mas nunca é demais relembrar os conceitos básicos — observa.
O executivo explica que a preocupação com as mudanças climáticas está relacionada à característica do rebanho leiteiro do Rio Grande do Sul, em que predominam as raças europeias (holandesa e jersey). Porém, Palharini acredita que não seria vantajoso alterar o perfil de raças em função da produtividade alcançada por estes animais.
Apesar da preocupação, o percentual de leite condenado é pequeno diante do volume total de produção. Em 2024, o pico de desvio de crioscopia chegou a 0,16% no mês de janeiro, segundo o Sindilat — nos meses de inverno, o índice não passa de 0,014%.