Em terra de soja, quem tem grão, é rei. Dados apresentados nesta terça-feira (02) pela Associação Brasileira de Produtores de Soja (Aprosoja) mostram um cenário em que o Rio Grande do Sul aparece como destaque, na contramão do país, justamente porque irá colher uma safra em que a produtividade fará a diferença. Depois de dois anos consecutivos de perdas causadas pela estiagem, o Estado tende a atenuar o efeito da queda de preço da commodity pelo volume de produção.
— Não tem um Estado brasileiro, com exceção do Rio Grande do Sul, que vai colher melhor do que no ano passado. Nenhum — frisou Antonio Galvan, presidente da Aprosoja, na atualização dos dados da safra 2023/2024.
A frase aplica-se à produção no atual ciclo, que teve forte impacto do El Niño. No RS, o fenômeno trouxe chuva em excesso, mas em outras regiões do país se traduziu pela falta de. Importantes produtores, como Mato Grosso, foram diretamente afetados. O que os dirigentes pontuam é que há uma grande diversidade de resultados, tanto nas lavouras de soja quanto nas de milho. E que a média acaba não traduzindo esse panorama complexo.
— É uma das safras mais complicadas que a gente já viu, realmente muito preocupante. E a média, na ação de políticas públicas, é muito injusta — ponderou Glauber Silveira, diretor-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho).
O pesquisador Mauro Osaki, do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, apresentou dados sobre a rentabilidade e sintetizou o que traz margens negativas para o produtor na atual safra: preço e produtividade em queda. A partir da análise de cinco cidades (Sorriso, no MT, Rio Verde, em GO, Dourados, no MS, Cascavel, no PR e Carazinho, no RS) evidencia o peso que esses ingredientes tem no resultado final.
Entre os locais pesquisados, apenas o município gaúcho registra crescimento da receita líquida operacional na soja para a safra 2023/2024, de 171,2%. A maior queda é projetada em Sorriso (MT): 130%.
— Produtores (com produtividade) abaixo de 50 sacas e preços abaixo de R$ 100 têm receita negativa. O fundo do poço que é diferente para cada um — comparou Osaki, dentro do quadro levantado no município mato-grossense.
De forma geral, o relatório aponta que "a forte queda nos preços e da produtividade venceu o efeito da redução do custo de fertilizantes e sementes", gerando uma queda (média) de 99,2% na receita líquida operacional. Esse recuo reflete a diminuição dos preços médios (18,4%) e da produtividade (18,2%).
— A queda de produtividade e de preço anulou o efeito de redução no valor do fertilizante — reforçou o pesquisador do Cepea/Esalq.
Mesmo em Carazinho, onde há estimativa de aumento na receita operacional líquida da soja, na média, há condições de produtividade e preço que podem deixar o cenário negativo. Uma produtividade de 55 sacas (que é a média estimada pela Emater para o RS) só gera uma margem positiva com cotações acima de R$ 95, por exemplo.
Os dados
- A pesquisa do Cepea/Esalq pesquisou cinco praças: Sorriso (MT), Rio Verde (GO), Dourados (MS), Cascavel (PR) e Carazinho (RS)
- Os valores médios dos custos operacionais efetivos e preços médios, usados no levantamento, provêm do projeto Campo Futuro via painel e foram corrigidos pela inflação
- Para o cálculo da receita bruta da soja consideraram-se valores médios de janeiro e fevereiro deste ano e a expectativa de produtividade com a estiagem registrada
- A receita líquida operacional da soja projeta, para a safra de 2023/2024: queda de 130% em Sorriso, de 86% em Rio Verde, de 89% em Dourados, de 87,2% em Cascavel, e aumento de 171,2% em Carazinho