O cultivo de vinhedos faz parte da história da família da biomédica Caroline Dani, mas não foi por herança que ela ganhou o título de Doutora Uva. Nascida em Flores da Cunha, na Serra, buscou formação na área da saúde, onde encontrou espaço para estudar a fruta que conhecia desde pequena. Nas pesquisas desenvolvidas ao longo do mestrado e do doutorado em Biotecnologia, deu um novo status ao suco de uva, ao apontar saúde na lista de qualidades da bebida.
A paixão pelo universo vitivinícola foi além do mundo acadêmico e levou a Ph.D. a explorar novos territórios. Hoje é diretora da seção RS da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS-RS) e uma das desenvolvedoras da plataforma Brasil de Vinhos, um portal virtual com informações sobre o setor. Ela conversou com a coluna e contou um pouco da sua história profissional. Veja trechos da entrevista.
Como começou sua história com a uva, o vinho, o suco?Sou neta de vitivinicultor, meu pai é enólogo, tínhamos uma vinícola em Otávio Rocha, interior de Flores da Cunha, onde nasci. Depois, fiz Biomedicina, na Feevale e quando decidi fazer mestrado, doutorado, fui estudar o suco de uva. Conhecer um pouco mais do mundo da uva e do vinho que, para mim, era muito o mundo da minha infância, do que tinha vivido. Sempre foi o sustento da minha família. Meu bisavô e meu tataravô foram fundadores da Cooperativa Vinícola Otávio Rocha.
Como foi a trajetória no mundo acadêmico e a posterior transição de carreira?
Fui professora do Centro Universitário Metodista (IPA) durante 14 anos, sempre desenvolvendo pesquisas na área. Em 2012, fui convidada pelo Ibravin para fazer parte do projeto 100% Suco de Uva. Comecei a levar um pouco do que fazia na academia para o setor. Quando começamos, não havia nenhum artigo publicado sobre suco de uva. À medida que fui estudando o suco, os polifenóis, senti falta de conhecer mais sobre vinhos do mundo. Em casa, meu pai sempre dizia para bebermos vinho nacional. Fiz o curso de sommelier e me achei ainda mais. Na sequência, entrei como diretora da ABS. Como fiz meu pós-doutorado nos EUA, pude conviver com o vinho americano e atualmente dou aulas sobre. O vinho virou a minha vida. Tenho consultoria, atuo na ABS e administro uma empresa familiar.
Fale sobre a pesquisa sobre a saudabilidade do suco de uva...
Foram 16 anos de pesquisa. Fizemos uma com animais em que identificamos que os que consumiam dieta rica em gorduras e tomavam água, engordavam mais do que os com a mesma dieta e suco. Fomos estudar e descobrimos o papel dos polifenóis. Então, desenvolvemos uma pesquisa com idosos, em que consumiam suco de uva (integral, 400 ml por dia) por 30 dias. A conclusão foi de que tinham redução de parâmetros como colesterol, triglicerídeos, etc. Mais a parte dos antioxidantes. Depois, um estudo relacionando o consumo com exercício, com o suco potencializando os efeitos provocados pelo exercício. Também fizemos com esportista.
Como classificaria o momento atual do vinho brasileiro?
O que vinho brasileiro precisava era de uma oportunidade. Na pandemia, foi um momento que as pessoas precisaram ficar mais em casa, houve dificuldade de importação, questões que trouxeram a possibilidade de optarem e de se permitirem provar o vinho brasileiro. E veio com uma flexibilização do setor, mais disposto a ousar em um rótulo, a fazer uma maceração carbônica, etc. Essa gama de opções no mercado também facilita. Hoje, o consumidor está mais consciente em relação ao produto nacional.
E o nome Doutora Uva?
Por ter doutorado, me chamavam de doutora. Diziam “ lá vem a doutora vinho, a doutora suco de uva, a doutora uva”. Minha experiência no Ibravin foi uma escola, muitas vezes precisava “traduzir” o significado do estudo. Quando interrompeu as operações, pensei: preciso continuar com esse papel. O (instituto) Dra. Uva veio com o objetivo de poder falar sobre Ciência, uva, derivados, participar do Wine in Moderation (coalizão internacional de cultura sustentável do vinho).
Qual a proposta da plataforma Brasil de Vinhos?
Quando surgiu a ideia, na pandemia, pensamos: o que temos de dados do Brasil? Onde estão essas vinícolas, quais são? Meu pai sempre foi um defensor do vinho nacional, e eu aprendi com ele, foi ele que me passou esse amor. São mais de 20 mil famílias que vivem da uva e do vinho no Brasil. Toda vez que um brasileiro abrir a janela de sua casa e no seu quintal ou próximo da sua casa tiver um vinhedo, ele vai entender o produto como seu. Essa ideia que veio com o Brasil de Vinhos é de poder mostrar a cara do Brasil. Fazer com que as pessoas tenham acesso rápido à informação. Quando você dificultar a pessoa de encontrar um assunto, ela vai fazer outra coisa. O objetivo é facilitar o acesso à informação, para que possam visitar e conhecer.