O cenário do consumo de veículos mudou bastante nos últimos 10 anos no Rio Grande do Sul. Os carros de entrada novos, com menor tecnologia embarcada e preços mais acessíveis, perderam espaço. Em 2013, detinham 24,53% do mercado gaúcho. Em 2022, foram 8,47%. Agora, nos quatro primeiros meses de 2023, representam 5,54% das vendas. Por outro lado, os utilitários-esportivos, conhecidos pela sigla SUVs, saltaram de 10,04% em 2013 para 54,09% no mesmo período, assumindo a liderança do setor.
Uma das explicações para a queda das vendas de carros de entrada e o salto das SUVs está na própria indústria. Hoje, são comercializados mais de 100 utilitários-esportivos no país, de acordo com a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave). Já os veículos de entrada estão reduzidos a praticamente dois: o Fiat Mobi e o Renault Kwid. Modelos que outrora eram líderes de venda, como o Gol, da alemã Volkswagen, foram, aos poucos, deixando de ser produzidos.
- É uma tendência mundial. Nos Estados Unidos, há apenas dois modelos por menos de US$ 20 mil. Em 2017, eram 11. No Brasil, dos 20 carros mais vendidos, só seis são de menor valor. Com a pandemia, falta de insumos e problemas de comercialização, as montadoras tiveram que produzir menos, então priorizaram os que dariam maiores ganhos, ou seja, carros com maior valor agregado - explica Paulo Siqueira, presidente do Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos do Rio Grande do Sul (Sincodiv RS), que enviou os dados à coluna.
Além disso, os próprios veículos de entrada foram ficando mais caros nos últimos anos, à medida em que começaram, eles também, a receber novas tecnologias, algumas obrigatórias de segurança e redução de emissão de poluentes. Isso somado às crises econômicas que o país enfrentou recentemente, de natureza política e sanitária, afastaram uma parcela da população do mercado do "zero quilômetro".
- Os carros de entrada de hoje não são os populares dos anos 1990. O próprio mercado dificilmente aceitaria veículos com padrões inferiores aos que temos hoje, com ar-condicionado, air bag, conectividade. Sem contar a tecnologia agregada por natureza legal, como equipamentos de segurança. E tudo isso custa caro - comenta Siqueira.
Para fechar, o presidente da entidade também avalia que o crédito restrito tem impactado as vendas do segmento. Ele cita que índice de vendas com financiamento, que já foi maior de 60%, hoje está abaixo de 40%. Também comenta que, para além do preço do carro em si, também precisa ser levado em consideração outros custos agregados.
- Não adianta ter um preço popular, mas a tributação, por exemplo Io PVA, ser impopular. Taxas de licenciamento, seguro, preços de peças de reposição caros também afastam o consumidor, principalmente de menor renda.
O levantamento não indica a quantidade bruta de venda de SUVs e carros de entrada no Rio Grande do Sul. No Brasil, para se ter uma ideia, em abril de 2013, foram comercializados 57.974 veículos de entrada, e 23.893 utilitários-esportivos. Dez anos depois, em abril de 2023, foram 9.166 carros de entrada vendidos, e 54.049 SUVs. Lembrando que a pesquisa aponta os carros novos.
Os dados mostram ainda que carros sedan pequenos e médios diminuíram bastante a participação nas vendas. De maneira mais tímida, também caiu a participação de hatch pequenos, como HB20 e Onix.
Política de incentivo pode mudar cenário?
Na última semana, o vice-presidente e ministro de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin anunciou medidas de incentivo para baratear os carros no país. Segundo ele, haverá desconto, por tempo limitado, de IPI, PIS e Cofins de até 10,79% para veículos de até R$ 120 mil. Há a expectativa que modelos que custam hoje cerca de R$ 70 mil possam ser comercializados por aproximadamente R$ 60 mil.
Na visão de Paulo Siqueira, no entanto, as mudanças não devem ser suficientes para haver uma alteração significativa do cenário atual, onde SUVs lideram as vendas.
- O acesso ao veículo tem mais a ver com geração de emprego, renda e oferta de crédito do que outros fatores de natureza fiscal. Pode sim ter incentivo, mas na nossa visão, não traz a solução mais eficaz. Dificilmente o cenário atual se reverteria por conta do lançamento de um veículo considerando apenas o preço. Isso tem que estar atrelado a uma política de crédito eficaz, entre outros elementos - finaliza.
Ouça o podcast Nossa Economia sobre carros populares:
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Equipe: Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br) e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br)
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