Você já pode ter recebido um e-mail de uma empresa com uma sugestão muito personalizada de algo que precisa comprar e pensado: "parece que a empresa já sabe o que quero". E ela de fato já sabia. Cada vez mais, varejistas têm investido na análise e no uso de dados para alavancar as vendas. A coluna falou sobre isso com Elia Chatah, líder de Varejo da SAP Brasil. A conversa aconteceu recentemente, durante a 113ª edição da NRF, feira mundial de varejo em Nova York. Confira trechos abaixo e a entrevista completa no podcast Nossa Economia, de GZH, no final da coluna.
O que muda na vida do consumidor com as empresas coletando cada vez mais dados, cruzando-os e fazendo interpretações? Como o consumidor percebe a aplicação de uma forma positiva?
O consumidor se relaciona com marcas, não com um canal de vendas. O consumidor tem que ser único na sua jornada de compra, seja no canal físico ou digital. É necessário ter uma continuidade no atendimento. Então o consumidor que comprou na internet quer poder continuar comprando na loja física. A loja física precisa saber dessa compra. Então, primeiramente, esse relacionamento tem que ser único.
E é um relacionamento que não pode terminar na compra, certo? Tem o pós-venda, a resolução de eventual problema, a volta para comprar novos produtos.
Essa jornada tem que ser completa, desde o início da compra até uma eventual devolução.
Como ficam as lojas cujos atendimentos ainda são separados entre e a operação física e a virtual?
Incomoda o consumidor ter que se identificar toda vez que se relaciona com aquela marca. Ele se relaciona com marcas e não com canais de venda. Não importa que canal ele comprou, ele precisa ter um processo fluído de compra. Se ele comprou na internet e quer devolver via telefone, e alguém ir buscar na casa dele, tem que ser simples, ágil e flexível.
Às vezes temos a percepção de que falamos de um produto, e depois, quando abrimos uma rede social, aparece um anúncio dessa mesma marca. Como funciona isso?
Isso é interessante. Estamos vendo aqui que o consumidor começa, eventualmente, um relacionamento com a marca de forma anônima. Ele recebe um post no Instagram e começa a dar o clique para checar qual é o produto. Nesse momento, o sistema de tecnologia já começa a identificar a jornada de compra do consumidor, mesmo ele sendo anônimo. Em um determinado momento, conseguimos o primeiro dado, que é o IP da máquina ou do celular. Depois, conseguimos um e-mail, um cadastro para newsletter. Dessa maneira, vamos agregando dados e conhecendo aquele consumidor que começou anônimo. Ele começa a tomar forma.
Um outro ponto é a privacidade. Nós temos a a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), então temos limites para o uso dos dados das pessoas. As marcas precisam cuidar também para não serem inoportunas. Como lidar com isso?
A primeira coisa que a gente pede é o consentimento. Isso está ligado à LGPD, onde a partir do consentimento, você começa a pegar dados. O problema hoje é que as empresas, eventualmente, coletam muitos dados e não usam a favor do consumidor. A partir do momento que o consumidor percebe que os dados são usados a seu favor, ele deixa fazer isso e gosta, porque reverte em favor dele, seja através de uma promoção, seja através de um produto específico que faça sentido para esse consumidor.
Tem exemplo de como um dado pode ser usado a meu favor?
Costuma-se dizer no varejo que o dado é o novo petróleo, mas não adianta nada eu ter um litro de petróleo, pois vou preferir um litro de gasolina ou de etanol. Não basta ser o dado puro, é preciso transformá-lo em informação. Hoje, o consumidor dá muito valor para a sustentabilidade e para empresas que realmente agreguem valor à vida dele. Temos um cliente que é do setor de produtos esportivos. Essa empresa, na verdade, não enxerga o consumidor como um cliente, mas como um atleta. Então ela comprou aplicativos de monitoramento de sono, de nutrição, de exercícios, e a partir do momento que o cliente está usando aquele aplicativo, ela sabe meus dados. Eu coloco que tipo de tênis e roupa que estou usando para aquele treinamento, e dou a informação de quanto já corri com aquele calçado. Aí, a empresa sabe se já está na hora de trocar. Então, eu uso o dado a favor do consumidor, para falar "olha, a gente sabe que você está no Central Park agora, com o seu consentimento. Sabemos que seu tênis está com 400 quilômetros de uso. Está na hora de fazer a troca. Ao seu redor tem três ou quatro lojas. Se você chegar em uma loja agora, você vai ter 20% de desconto".
Quando vamos em uma loja e vemos várias câmeras, nem sempre elas são apenas para segurança, certo?
Se você der uma volta aqui na NRF, e mesmo em Nova York, a gente costuma andar olhando para cima, porque é onde estão as câmeras, e elas são usadas de diversas formas. Hoje, no varejo principalmente, elas são usadas para áreas quentes e áreas frias, além da segurança. Existem projetos de pagamento com o reconhecimento facial, não precisa nem estar mais com o seu cartão ou com o celular, basta o seu rosto. É usada também para contar pessoas, para saber quanto tempo ela está parada em uma gôndola, e isso é importante para o varejista. Temos um projeto de loja em que uma gôndola olha para a outra e avisa que tem uma falta de produto naquele espaço, porque tem uma câmera olhando para outra.
Ouça a entrevista na íntegra:
* A coluna viajou a Nova York a convite de Sindilojas Porto Alegre, CDL POA e FFX Group
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Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br) Equipe: Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br) e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br) Leia aqui outras notícias da coluna