O jornalista Daniel Giussani colabora com a colunista Giane Guerra, titular deste espaço
A Associação Nacional das Livrarias está concluindo um anuário que mostrará números atualizados do setor no Brasil. O último levantamento completo foi feito em 2013. Ou seja, fará um recorte de cerca de 10 anos. Essa categoria de empresa passou por momentos conturbados nesse período, com grandes companhias, como Saraiva e Cultura, em recuperação judicial — essa última, em processo de falência, suspenso na quinta-feira (16). Também ganhou força a concorrência por multinacionais pela internet. Mas os dados trazidos pela ANL mostram que a redução foi menor do que a esperada. No Rio Grande do Sul, houve queda, no saldo, de menos de 6%. E de acordo com Marcus Teles, presidente da Associação Nacional de Livrarias (ANL) e CEO da Leitura, desde abril de 2021, tem se aberto mais lojas do que fechado. Veja trechos da entrevista que a coluna fez com o executivo, bem como uma conversa que ele teve para o programa Acerto de Contas (domingos, às 6h, na Rádio Gaúcha).
Em 2013 foi publicado um anuário com alguns números, inclusive do Rio Grande do Sul, de quantidade de livrarias, e vocês estão para publicar um novo em 2023. O que se já se pode adiantar?
Em 2013, o anuário contou 340 livrarias no Rio Grande do Sul. Dez anos depois, — ainda não está fechado o anuário, deve ser publicado em março ou abril —, o Estado tem cerca de 320 livrarias. Então tivemos, no saldo, uma queda de cerca de 20 livrarias, ou 6% no mercado, mas agora vivemos um momento de recuperação. Tivemos queda primeiro na crise de 2015, e depois entre 2018 e 2019, quando entraram em recuperação judicial a Saraiva e a Cultura, que fecharam algumas lojas. Voltamos a ter queda com o início da pandemia. De abril de 2021 pra cá, tem se aberto mais livrarias do que fechado. Nós medimos, por exemplo, que entre o fim de abril de 2021 e novembro de 2022, já tinham aberto mais de cem livrarias no Brasil, e provavelmente umas oito ou 10 no Rio Grande do Sul. Mas, nos últimos 10 anos, houve uma pequena queda e houve também uma redução nas áreas das livrarias. As mega lojas, acima de mil metros quadrados no Brasil, tinham mais de cem e hoje estão próximas de 50.
As livrarias que estão abrindo apostam em que tipo de experiência?
Estão abrindo pelo Brasil inteiro livrarias menores, a maioria em uma faixa de 50 a 300 metros quadrados. Mas, também, abriram algumas megas nos últimos anos. A própria Leitura, de qual sou CEO, nos últimos três anos reduziu duas lojas e abriu cinco megas, acima de mil metros. No Rio Grande do Sul, vemos notadamente o crescimento da livraria Santos, ela quase dobrou nos últimos quatro anos. A própria Leitura abriu no BarraShopping Sul nos últimos anos. A Página abriu também no shopping Praia de Belas. No interior a Vanguarda também andou crescendo. Então temos uma movimentação do mercado. Algumas empresas que estavam com dívidas e prejuízos antes da pandemia tiveram dificuldades e fecharam lojas. E outras, que estavam bem financeiramente, estão aproveitando pra abrir.
Percebemos uma mudança, com várias marcas de livrarias novas entrando no mercado. Qual foi a estratégia dessas empresas para manter expansão, enquanto outras estavam fechando?
A Leitura, por exemplo, tem um crescimento quase que linear. Se a gente pegar os últimos anos, temo um saldo de cinco lojas abertas por ano. Mas é sempre muito vivo o varejo. Então a nossa estratégia é clara. Primeiro, enquanto tinha guerra de preços com as multinacionais pela internet, fomos para mercados com carência de livrarias. Crescemos primeiro em Minas Gerais, Goiás, Brasília. Depois o crescimento para o Nordeste, depois para o Norte. Em mercados mais maduros, como Porto Alegre, fomos depois. Outra estratégia é a proximidade. Toda loja tem gerente que olha para a comunidade. Em Porto Alegre, ele vai procurar por autores e editoras locais.
A venda de livros online ou mesmo o acesso a esse tipo de leitura nas telas foi algo que ganhou força na pandemia. O que atrai o consumidor de fato para a livraria física?
São dois perfis diferentes. A loja virtual é boa para quando você já sabe o que quer. A livraria física é uma experiência diferente. É como eu comparar assistir um filme em casa ou ir no cinema. As pessoas são sociáveis. Ao ir na livraria você encontra as pessoas, vê os livros, assiste lançamentos, palestras. É muito mais agradável. Quando a pessoa já sabe um livro, por exemplo, pode comprar na internet. Mas as vendas das livrarias já voltaram a níveis superiores de antes da pandemia. Também as livrarias do Brasil e no mundo estão recuperando. Não há uma queda. No total de livros, vendemos mais em 2021 do que em 2019, antes da pandemia. Em 2022 também houve um crescimento. Então, diferentemente do que parece, as pessoas passaram a ler até mais durante a pandemia. O que há é uma divisão de mercado. Tem momentos que você prefere comprar via internet ou por WhatsApp, e tem momentos que a pessoa prefere comprar nas livrarias.
Quando a gente fala em livraria, a gente pensa em livros, no mercado editorial, mas estas operações têm uma gama muito grande de produtos. Qual é o carro chefe de vendas?
No ano passado os livros mais vendidos foram os da Colleen Hoover, focado no infantojuvenil ou jovem adulto. Isso tem se destacado nos últimos anos. Os jovens, há 20 anos, liam mais livros que a escola mandava ler. Hoje não. Eles leem livros de séries e autores que eles escolhem, que conhecem nas redes sociais, nas séries de TV. A grande parte dos filmes são feitas em cima de livros. Então sai uma série na televisão, na Netflix e depois ela cresce quase que de imediato também nas livrarias. O livro está passando por um bom momento e a venda total está indo muito bem. E tem outras áreas crescendo, como clássicos, livros juvenis, mangás. Tem áreas que retraíram, como livros escolares. Muitas escolas acabaram passando por sistemas de ensino com apostila, o que reduziu a venda de livros.
E como vai ser daqui pra frente? Principalmente olhando para essa questão de lojas físicas e online?
As primeiras lojas virtuais do Brasil eram de livraria. Estamos falando já de 27 anos com essa disputa. Ela é nova para alguns setores, mas para nós, é bastante consolidada. Hoje o cliente pode escolher ele. Pode comprar seu livro pela internet, nas livrarias, no WhatsApp da loja. Ele tem mais opções e compra, em momentos diferentes, em várias delas. As livrarias seguem investido, e estamos em um momento de maior diversificação de marcas. Redes regionais crescendo. E o número total de livrarias tem, em dez anos, uma diferença menor do que a gente esperava. Todos esperavam uma queda de mais de 10% das livrarias, e ficou abaixo disso. Entendemos que o mercado está se recuperando bem, está crescendo e o público está lendo mais, principalmente jovens.
A rede Leitura tem planos de expansão para abrir novas unidades aqui no Rio Grande do Sul?
Para esse ano, provavelmente, vai dar tempo. Nós temos duas negociações em andamentos. Entendemos que, no fim desse ano, ou no máximo ano que vem, mais uma loja será aberta. Provavelmente na Região Metropolitana.
Colaborou Guilherme Gonçalves
Coluna Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br) Equipe: Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br) e Guilherme Gonçalves (guilherme.goncalves@zerohora.com.br) Leia aqui outras notícias da coluna