Nas últimas semanas, cobrir o mercado financeiro é ter sobressaltos sucessivos ao longo do dia. Quando são acionados os circuit breakers, sinto uma descarga de tensão pelo corpo. Nessa segunda-feira (16), ele foi acionado logo após a abertura do mercado, suspendendo os negócios. Mais ou menos no mesmo horário, a rede da escola da minha filha mais velha começou a anunciar a suspensão das aulas. Eu precisava entrar no ar com as informações da bolsa e, ao mesmo tempo, pensar como seriam os próximos dias na minha vida pessoal.
Apoio a decisão da escola, confio nas direções das instituições de ensino e nas autoridades de saúde. Sou solidária ao dilema deles ao tomarem essas decisões. Foram dias refletindo se o mais adequado era evitar que as crianças ficassem com os avós, mantendo as aulas, ou adotando o isolamento para conter o coronavírus antes de as temperaturas baixarem.
No final da noite, recebo uma mensagem da querida "profe Clá" dizendo que estão planejando atividades para as crianças fazerem em casa. Eu respondo que está tudo bem, que confiamos neles e que a preocupação da nossa família neste momento é outra. O aprendizado pode esperar. E até penso que esses momentos serão também um aprendizado para as crianças e para nós, nem que seja para valorizarmos a nossa rotina da vida normal, da qual costumamos tanto reclamar. Meus filhos começaram a chorar à tarde passada quando se deram conta do tempo que passariam sem ir às escolas que tanto gostam. Eu, já tensa, fiquei brava por menos de um segundo. Até que eu e meu marido nos levantamos e os acolhemos em um demorado abraço, dizendo que entendíamos a tristeza, que estávamos felizes por saber que eles gostavam tanto da nossa vida e que ela voltará ao normal.
Expliquei também que precisamos preservar os avós. Que esse vírus muito forte pode passar pela gente e deixar essas pessoas que tanto amamos muito doentes, e estou sendo bem enfática nisso. Ao ouvirem esse argumento, a tristeza dos pequenos começa a se dissipar e percebo o engajamento por entenderem o propósito do sacrifício. As crianças estão com meus pais hoje e, se não conseguirmos arranjar nossos horários, é possível que a gente não os veja nos próximos dias para evitar a exposição, o que faz meu coração doer. Ficarão avós e netos isolados. Mas eu penso que daqui a um ano, olharei para trás e serão apenas alguns dias, mesmo que sejam algumas semanas.
Com ajuda do meu irmão, trabalhamos em uma conscientização dos nossos pais, que costumam preocupar-se só com os filhos e netos. Trouxe notícias do que está ocorrendo em outros países, passei orientações das autoridades de saúde no nosso noticiário, disse que compraremos tudo o que precisarem, que a saúde deles é essencial para nós e que, se tudo o que fizermos parecer exagero no futuro, será porque tivemos sucesso.
Colunista Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Colaborou Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br)
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