O dólar já vinha subindo nos últimos meses e disparou nesta semana, superando a barreira dos R$ 4. Quando ocorre isso, aparecem as afirmações de que a moeda norte-americana em alta beneficia os exportadores. Não é bem assim. É preciso cuidar para não ter uma visão tão simplista. Assim como não afeta só quem "viaja para a Disney", como também aparece nos comentários.
A coluna Acerto de Contas pediu para duas fontes responderem à pergunta: o dólar alto é sempre bom para exportadores?
Jorge Delgado, diretor da Dana, uma das principais indústrias da Região Metropolitana de Porto Alegre:
"Para quem tem visão simplista, sim. Na realidade, é um grande problema. Em primeiro lugar, dólar alto esconde todas as ineficiências e cria a ilusão de que taxas altas devem ser permanentes. Outro problema é que dólar alto gera inflação de custos. Por fim, taxas altas também geram insegurança quanto a novos negócios, pois empresários entram em contratos com taxa alta e, quando o mercado vira, tomam uma invertida e sofrem grandes perdas. Isso porque precificaram errado... O bom empresário quer previsibilidade e regras claras. Hoje, todos estão navegando sem saber que Brasil teremos em cinco meses."
Antônio da Luz, economista-chefe da Farsul, entidade que representa o agronegócio no Rio Grande do Sul:
"Nem sempre. Quem exporta geralmente tem uma visão mais aberta de mercado, ou seja, quem vende também compra de fora, busca fornecedores mais baratos por onde seus produtos passam. Dessa forma, podemos estar também aumentando os custos de produção e, no limite, neutralizando os ganhos. Mas câmbio elevado tem um enorme impacto inflacionário, o que tira do mercado interno - é raro quem produz somente para fora - uma parte do seu poder compra, o que tende a reduzir as vendas internas. Quando somamos os impactos positivos e negativos, nem sempre o saldo é positivo. Outro aspecto importante da taxa de câmbio é no preço de produtos importantes para a própria vida. Tem gente que acha que câmbio elevado prejudica quem quer passar as férias no exterior. Em primeiro lugar, não há problema algum nisso. As pessoas trabalham e gastam seu dinheiro onde bem entendem, mas os maiores prejudicados não são essa parte da sociedade, mas justamente as camadas de renda mais baixa. Grande parte dos remédios que tomamos diariamente para uma simples dor de cabeça ou para nos manter vivos sofrem enorme influência do câmbio. Ou o remédio pronto, ou o sal ou a molécula do remédio tem grandes chances de serem importadas, ou seja, aumenta a taxa de câmbio, aumenta o custo do medicamento. Em uma sala de cirurgia, dezenas de materiais são importados. As peças de manutenção dos aparelhos de imagem que nos ajudam no diagnósticos das doenças, em boa medida, são importados. Enfim, o câmbio impacta o nosso custo com saúde. Os pães, os biscoitos, o macarrão e demais produtos que têm origem no trigo que comemos diariamente, em boa medida, vem de um trigo importado. Aumenta o câmbio, aumenta o preço dos alimentos. A tecnologia que usamos, em boa medida, é importada ou tem equipamentos importados embarcados. Aumenta o câmbio, fica mais caro trocar de celular, de computador, de TV, de equipamento de som e etc. Serviços de streaming ficam mais caros, o carro fica mais caro, o combustível fica mais caro e assim por diante. Enfim, mesmo o exportador que tenha saldo positivo, pode não ser suficiente para cobrir o rombo que ocorre na hora em que ele for gastar seu dinheiro. Câmbio, para a maioria dos "beneficiados", é uma ilusão de curto prazo."