A cada fim de ano nos surpreendemos. Tudo passou rápido! Janeiro foi ontem e já volta de novo? No calor de dezembro, nos esquecemos do inverno. É impossível agarrar o tempo, aprisioná-lo numa caverna e usá-lo só quando nos convenha.
Mas o tempo não é o inimigo. O tempo é nosso lar na Terra. Dias, horas e minutos são apenas partes da casa. A modernidade, porém, foi abalroada pelo consumismo desenfreado e despreza o que for concreto. Fazemos tudo rápido, pela internet, como duas vidas em dois mundos – o real e o virtual.
Não falo do mundo imaginário criado na infância e que nos acompanha. Agora, por exemplo, cada qual se imagina ricaço com os R$ 200 milhões da Mega Sena da Virada ganhos "numa boa". A imaginação é alimento fundamental da alma. Sem ele, o raciocínio seria só aritmética e não teríamos o que temos. Viveríamos ainda nas cavernas, não conheceríamos o átomo nem os elementos químicos. Não haveria Santos Dumont nem Einstein, Ovídio, Maimônides ou Pasteur, nem Freud, Spinoza, Marx, Galileu, Beethoven, Mozart, Castro Alves, Pessoa e Drummond.
Falo do "mundo virtual", artificial e postiço, que nos afasta da verdade e da vida e é estranho à Criação. Sem História, se apossa de nós ao nos facilitar aquilo que, ontem, exigia pensar e se esforçar. Na letargia da preguiça (que não verifica a autenticidade de nada) nos enfiam tudo goela abaixo, como água aos sedentos.
Não julgo as decepções ou alegrias de 2018. Nem as projeções para 2019. Isto é tarefa individual. Temos diferentes olhos e até o pulsar do coração é distinto.
Se Bolsonaro não se ocultar no mundo virtual das "redes" (como na campanha) e dialogar sem ódio e preconceitos, oxalá leve adiante a revolução representada na boa fé dos milhões que acreditaram em sua palavra. O mesmo ocorre com Eduardo Leite, mais jovem até do que Leonel Brizola, o último que nos governou olhando o futuro.
O fundamental é vencer a inércia e o atraso que Temer e Sartori (e seus antecessores imediatos) nos legaram.
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A morte de Heloísa Buarque de Holanda me implodiu de dor no fim do ano.
Conheci Miúcha em 1970, no exílio no México. Ela e a filhinha Bebel se refugiavam no pequeno apartamento em que eu morava com minha mulher, sempre que João Gilberto, marido e pai, tornava a própria casa insuportável na sua extravagância criadora de músico. Os laços profundos do exílio resistem até aos anos em que não a vi, e em que Bebel, adulta, seguiu a mãe, compositora e cantora.
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