O Código Penal, apontando crimes e delitos, já não se restringe aos tribunais, advogados ou professores e estudantes de Direito. Está nas notícias dos jornais, rádios e TVs, nas conversas em família e se entremeia, até, às confidências amorosas.
A extensa lista de políticos suspeitos de serem meros servos de grandes empresas (ou de mendigar essa condição), apresentada ao Supremo Tribunal pelo procurador-geral da República, é o retrato aterrador da partidocracia brasileira.
O exercício do poder sempre facilitou deslizes, mas ocasionais e a granel. A Lava-Jato descobriu o monstro oculto estruturado como bando criminoso pelos chefetes políticos e empresas de obras públicas.
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Agora, a lista do procurador-geral Rodrigo Janot surge como retrato aterrador e nojento da transformação de quase todos os partidos em matilha faminta.
Dois ex-presidentes, seis atuais ministros – inclusive o chefe da Casa Civil, esteio íntimo do atual presidente da República –, nove ou dez governadores, os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, quase uma centena de parlamentares (ou ex) do governo e da oposição formam um cardápio com todos os gostos e sabores e um fim único: corromper-se, vender-se ao corruptor mais próximo!
Os partidos são entes abstratos – quem age são os dirigentes e parlamentares. Também os governos são entes abstratos – o real e concreto são os governantes.
Assim, esta prostituição da atividade política tem nome e CPF, caminha e descansa, come e descome. Os prostituídos alegam que receberam "doações" previstas em lei e para campanha eleitoral. Mas ocultam o laço secreto que amarra quem recebe a quem doou.
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O bando criminoso, organizado pela partidocracia dominante em conluio com setores privados, apropriou-se de mais de R$ 3 bilhões no escândalo da Petrobras, segundo cálculos judiciais. Falta o montante do surto do ex-governador Sérgio Cabral, que envolveu o PMDB do Rio de Janeiro, além de outras piruetas (como as da Nuclebrás ou do metrô paulistano) envolvendo o PT e o PSDB.
Agora, a lista do procurador Janot para investigar os suspeitos de alta linhagem, essa gente que usufrui do privilégio de foro especial, leva a que de novo falem em "reforma política". De fato, buscam tão só salvar antecipadamente aqueles que Janot classifica de "praticantes de atos criminosos", como se a propina de antes fosse "direito adquirido", esta excrescência que aqui viceja.
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A lista de Janot desnuda o desvirtuamento do sistema partidário, mostra como a larápia mão humana degradou e prostituiu a política. Mas, nas eleições de 2018 (para presidente, governadores, senadores e deputados), talvez não haja opções melhores do que a dos suspeitos de hoje.
É improvável que o Supremo julgue os processos ainda antes dos registros de candidatos. Por outro lado, nem todos estão na lista.
Por exemplo: Paulo Maluf, o grande astro, chefão do PP, o Partido Progressista (que, com Paulo Roberto Costa, comandou o assalto à Petrobras), continua incólume. Condenado na França pelos roubos como prefeito de São Paulo, foi extraditado e aqui ficou preso breves dias, anos atrás. O relator do caso no Supremo, ministro Carlos Veloso, achou "constrangedor" que Maluf e o filho estivessem presos e sugeriu soltar ambos.
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As provas oferecidas por Janot em milhares de folhas chegaram agora ao Supremo Tribunal em dez caixotes. Quando vi pela TV sete funcionárias da Procuradoria-Geral transportando em carrinhos (e com carinho) aqueles imensos volumes, lembrei-me de cena semelhante em 1996 na Praça da Matriz, em Porto Alegre: oito caixas levadas da Assembleia Legislativa ao Palácio da Justiça, com o inquérito sobre a multimilionária roubalheira na CEEE no governo Pedro Simon.
O inquérito continua "em segredo de Justiça", sem qualquer sentença e tende a prescrever, sem que ninguém no Executivo, Legislativo e Judiciário busque fazê-lo andar.
Será diferente em Brasília? Lá, todos estão no baile. Todos, mais um. Ou até mais de um, mas pelo menos um!
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