O grupelho que, aos gritos de "viva a ditadura, queremos um general", invadiu a Câmara dos Deputados, dias atrás, queria (ou quer) de fato o quê? Que se institua a ditadura por um projeto de lei aprovado pelos parlamentares?
Ou, simplesmente, desmoralizar ainda mais aquilo que a ditadura direitista implantada em 1964 degradou de forma tão profunda que, até hoje, o Poder Legislativo é isto que está aí por não ter curado a chaga? Aqueles anos de mordaça e medo, sem crítica, sem imprensa livre, sem independência do Judiciário (em que a Polícia Federal só investigava e reprimia os opositores ao regime, nunca o crime nem os criminosos, como hoje), foram tempos de corrupção profunda.
A grande diferença é que tudo se escondia, nada podia ser investigado ou revelado.
Gritar (como agora em Brasília) pedindo "um general" para chefiar uma ditadura é insultar o Exército. É uma afronta à missão histórica das Forças Armadas, como se a função militar fosse destruir e subverter as leis que garantem os cidadãos e as liberdades, e não preservar o território pátrio.
***
Critico sempre a desfaçatez dos políticos que transformam os atos de governo em fonte de corrupção pessoal. Não há crime mais hediondo do que esse, pois afeta a sociedade inteira. Seus efeitos se multiplicam e caem sobre nós como chuva atômica – é invisível, não tem cor nem odor e se propaga em todas as direções, em contaminação constante.
Ao criticar, busco alertar e aguçar o sentido crítico, para que cada um localize e aponte erros, mentiras, embustes e falcatruas, vigiando o que é de todos e que os políticos pensam que é deles. Só assim contribuímos para aprimorar o sistema democrático.
Ao contrário, pedir uma ditadura, é ignorar o passado. Ou fingir-se de cego face a um passado tão recente, que as sequelas aí estão na política e em nossas vidas!
***
A visão de impunidade que domina os governantes é a sequela mais à mostra. Na ditadura direitista, roubava-se em surdina (como todo roubo) e o segredo tapava tudo. Denunciar era "subversão" e "terrorismo", punido com prisão, tortura, às vezes, até morte. Impunes, os verdadeiros subversivos e terroristas se refestelavam em diferentes níveis do poder.
Na época, os donos do poder tinham outros nomes, mas eram como Sérgio Cabral e Anthony Garotinho, ex-governadores do Rio de Janeiro presos nesta semana: sentiam-se intocáveis, protegidos pelo que eram. Tal qual o almirante Othon Silva (ex-chefão da Nuclebras), ou como aquela gente do PT, PMDB e PP que assaltou a Petrobras, hoje presa e alguns já condenados. Todos, lá e cá, sempre em conluio com grandes empresas e usando os serviços de marginais do crime, como o doleiro Alberto Yussef, para esconder o roubo na Suíça.
Ou alguém pensa que corrupção e propina foram invenções dos últimos anos? Ou que as denúncias são "pura perseguição", como diz Lula da Silva?
***
Fiquemos só nas prisões dos ex-governadores Garotinho e Cabral: a estrutura e a engrenagem do roubo multimilionário são iguais às utilizadas na Petrobras, por sua vez idênticas a todas as demais, anteriores ou posteriores.
Tão só na remodelação do Maracanã para a Copa do Mundo, Cabral recebeu mais de R$ 22 milhões em propina, como mostrou o Ministério Público.
Aqui em nosso Alegre Porto, terá corrido propina, e para quem, nas obras da Copa, todas sem licitação, sob a batuta da prefeitura? Ou, por acaso e felizmente, seremos nós uma isolada ilhota virgem em meio ao mar revolto?
***
Ou não nos importamos em que nos roubem, mintam e enganem, como ocorreu com o multimilionário assalto à CEEE, em 1988-89, no governo Pedro Simon, do PMDB?
O esquema corrupto foi até mais gritante do que os de agora: houve propina inclusive em obras nunca executadas. Em valores atuais, desviaram da CEEE R$ 820 milhões, mais do que todo o "mensalão", mas o processo repousa "em segredo de Justiça" na 2ª Vara da Fazenda em Porto Alegre, sem qualquer sentença, à espera de que prescreva.
Que segredos tão secretos guardará, já que ninguém o faz andar?
Leia outras colunas em zerohora.com/flaviotavares