Todo golpe militar é, por definição, um evento trágico. Abundam golpes nesse mundo turbulento e todos, é claro, foram fatídicos. Óbvio que alguns – como o funesto golpe dado pelo ditador Hadji Suharto, na Indonésia, em 1967, que durou 30 anos e custou a vida de meio milhão de pessoas, ou o golpe de Pinochet, no Chile, em 1973, que até hoje gente ignóbil ainda “apoia” – foram mais trágicos do que outros. Vários deles, como os dois mencionados acima, originaram obras-primas do cinema. É o caso, por exemplo, de Z, de Costa Gavras (sobre o “golpe dos coronéis” na Grécia, em 1967; sendo que Gavras dirigiu ainda Desaparecido, sobre o golpe no Chile), ou do recente Argentina, 1985, sobre o julgamento dos ditadores Videla e Massera, condenados à prisão perpétua por seu terrorismo de Estado.
Mas todo golpe militar, por mais trágico que tenha sido, desvenda também seu lado patético. Dois golpes desferidos contra a democracia no Brasil, em 10 de novembro de 1937 e em 1º de abril de 1964, tiveram, é claro, tanto a porção dramática quanto o lado canhestro: o famigerado Plano Cohen, forjado pelo integralista Olímpio Mourão, em 1937, e o avanço intempestivo e não autorizado desse mesmo Mourão, que se autodefiniu como uma “vaca fardada”, em 1964. Nenhum deles, porém, se desnudou tão constrangedor quanto o primeiro da estirpe: o golpe militar de 15 de novembro de 1889, que passou à história com o nome que, estranhamente, ainda mantém: Proclamação da República.
Baseado numa fake news e numa desilusão amorosa que desaguou em dor de cotovelo, deflagrado por um militar ressentido e originalmente monarquista, o golpe republicano fez aniversário no início desta semana. Devido ao feriado, revelou gente ainda parada em frente a quartéis clamando por um golpe – em pleno 2022. E assim, e por isso, a presença desconsolada dessas pessoas remete ao fato de que, mesmo que os golpes que se concretizaram tenham sempre um lado desprezível, nada desnuda mais sua eterna porção parva e sonsa do que... golpes que não deram certo.
A tentativa de golpe na Espanha, em fevereiro de 1981, o golpe desferido por Hugo Chávez, em fevereiro de 1992 (que resultou na prisão dele), e o golpe contra ele próprio, em abril de 2002 (que fez dele um ditador), se incluem nessa lista indigente e mambembe. Mas quem sabe se, no futuro, o patético “patriota do caminhão” não será imorredouro símbolo de um golpe natimorto?