Um levantamento feito pela repórter Gabriela Moreira, do SporTV, concluiu que, nos 20 clubes da Série A, o número de mulheres nos conselhos deliberativos é de miseráveis 3,6% sobre um total de 6.687 integrantes. Para se ter ideia do déficit de representação, o Inter é o primeiro do ranking com só 8,9%. Boa parte desse resultado acima da média nacional tem a ver com o pioneirismo da arquiteta Diana Oliveira.
Ela foi a primeira vice-presidente eleita na história colorada. O presidente era Giovanni Luigi (2013/2014), que a indicou chefe da reforma do Beira-Rio. Obras, prazos, reuniões, conferência de que o projeto seria cumprido em detalhes pela Andrade Gutierrez, as relações desse cipoal de interesses com o Poder Público e a Fifa — era tudo com a "guria briguenta", como ela mesmo se define nesta entrevista. Sem Diana, não haveria o Beira-Rio moderno de hoje.
Por onde a vice eleita e xerife da reforma do Beira-Rio?
Continuo trabalhando com arquitetura, mas voltada para estudos e pesquisa em gestão de futebol e de atletas.
Depois dos cargos que ocupaste, recebeste convite para voltar ao Inter?
Quando o Marcelo (Medeiros, presidente) foi eleito, chegou a mencionar de forma mais investigativa um trabalho com ele. Mas eu estava exausta. Tinha de dar um tempo.
Por que tão exausta?
Coordenei a obra em nome do Inter. Era uma função arduamente técnica. Ainda cumpria agenda de comunicação com a torcida, institucional, como vice. Então, tinha de receber o pessoal da Fifa e entidades do Brasil inteiro que vinham conhecer o projeto. As reuniões e decisões se davam em três pontas: BRio, Inter e Andrade Gutierrez. A interface do clube com as obras, em meio à pressão de terminar tudo a tempo, era comigo. Foi bem desgastante.
Como se deu o seu afastamento do clube?
Saí do Conselho no início de 2018. A gestão do Piffero (Vitorio Piffero, presidente em 2016, ano do rebaixamento) foi desastrosa. Mas não foi só por isso. Saí porque achei que tinha dado a minha contribuição. O clube precisa de renovação. E, naquele momento, eu não tinha como contribuir mais, diante das exigências de dedicação.
Como assim?
Essa relação entre dirigentes e conselheiros é danosa. Não a reconheço como proveitosa. E não se trata de um grupo contra outro. As pessoas da tua própria gestão nem sempre ficam felizes com o teu sucesso. Isso se dá pela não remuneração dos dirigentes. Dessa forma, a busca é pelo reconhecimento, basicamente. Quando é uma mulher que conquista esse reconhecimento, o desconforto é maior. Tenho certeza de que isso aconteceu comigo no Inter.
Cresci porque sabia de algo que muitos à minha volta não dominavam.
DIANA OLIVEIRA
Ex-vice eleita do Inter
Uma mulher tem de fazer mais para ser aceita em um universo masculino. É isso?
É isso. Tu tens de fazer sempre mais e melhor. E, quando consegue, corres o risco de se apossarem do que construíste. É aquela história: os homens são avaliados pelo potencial; as mulheres, pelo histórico.
Continua ligada a algum grupo político?
Não.
Vais aos jogos?
Menos do que gostaria, mas quando vou, é uma catarse. A coloradagem é o que me interessa.
Por que é tão difícil uma mulher chegar a um cargo tão importante na hierarquia de um clube?
Cresci porque sabia de algo que muitos à minha volta não dominavam. Eu estudei o projeto do Beira-Rio. Os grupos do Giovanni e do Piffero polarizavam em torno do modelo da reforma, e o meu conhecimento era fundamental. A partir das manifestações no Conselho, entrei na comissão de obras do colegiado. Dali, acabei na comissão de obras do clube, criada pelo Giovanni para tocar a modernização. Dos 13 integrantes, eu era a única mulher.
Como foi no começo, antes de ser vice eleita?
Eu era meio a guria briguenta (risos). Não era bem assim para levantar a voz comigo. Aliás, não é bem assim para me atropelar. Fui sendo respeitada. O Eduardo Mariotti, do Jurídico, me ajudou muito. Max Carlomagno foi um grande parceiro também. Houve homens que respeitaram o meu trabalho e ascensão, mas a maioria torceu o nariz. O cargo de vice eleita foi determinante para atuar nas obras em nome do Inter, em termos de aceitação dentro do sistema.
Qual a sua impressão de Eduardo Coudet?
Ele está conquistando espaço. Afortunadamente, o time tem mostrado evolução. Coudet está mudando todo o jeito de o Inter jogar. A saída de bola com os zagueiros é interessante. Antes era só com o Lomba, às vezes só com o Cuesta na ligação direta. Teve personalidade para tirar Moledo com esse argumento. Não entendo que Lindoso é só primeiro volante, necessariamente. Quando Dourado se machucou, aliás, passamos a ter problemas. Fiquei desconfiada com Musto no início, mas ele vem melhorando em uma posição, à frente da zaga, que é crucial. A ponderação que faço são os laterais. Apesar dos elogios recentes a Rodinei e Uendel, este é um problema a resolver para a mecânica funcionar. Lateral tem de defender, eu sei, mas precisa de qualidade no cruzamento do fundo, ainda mais com Guerrero. E prefiro o D'Ale por dentro, e não pelo lado.
O Inter pode disputar título?
Pode, mas a instituição tem de assumir uma postura mais controlada nos momentos decisivos. Não se pode entrar ou dar vazão a qualquer polêmica. Minha mensagem é conversar com quem quer ouvir e não servir de escada para medíocre. Isso vale para todos, na relação com a imprensa e dentro do clube. Nessa hora, todo mundo quer crescer em cima. Se eu tivesse dado ouvidos para críticas vazias e até ofensivas que recebi, não teria acabado a obra do Beira-Rio. Tem de zerar a comunicação com essas pessoas e se relacionar com quem quer ouvir e propor. Na hora decisiva, não pode entrar nessas barcas. Parece-me que Coudet tem uma postura de se colocar distante das questões, até por ser de fora. Isso é bom.
Quando você vai voltar ao Inter?
(Silêncio) Não tenho planos de voltar agora. (Mais silêncio) Quero me desafiar em novos ares.