Giovane Zanardo, 49 anos, pai de dois filhos colorados e casado com uma colorada tão torcedora como ele, não é um rosto conhecido. Ele é parte da profissionalização de vários setores do Inter. Selecionado a partir de uma rigorosa busca por executivos no mercado feita por um empresa contratada só para isso, assumiu como diretor-executivo de finanças na alvorada de 2017.
Tivesse cabelos, eles ficaram em pé diante da terra arrasada. Vinha da indústria farmacêutica. Três anos depois, festeja a chance de fechar o ano com dinheiro em caixa e taça no armário, caso o Inter embolse os R$ 52 milhões de prêmio da Copa do Brasil. Giovane não queria falar muito nisso, até para não o acusarem de contar com o ovo antes da galinha. Insisti. Ele não caiu na minha lábia, mas arranquei a manchete aí do alto, convidativa para entender o processo vivido pelo Inter.
Qual a diferença do cenário financeiro para você trabalhar hoje, em relação ao que encontrou pós-Série B?
No começo de 2017, a situação era terrível. Tínhamos perda de receita por estar na Série B. Nossos ativos (jogadores) não tinham atrativo forte, pela visibilidade menor. O potencial de novos sócios, em que pese a resposta do torcedor, que não deixou de contribuir na hora ruim, naturalmente caiu. Havia atraso de salários e dívidas não negociadas com fornecedores e parceiros. Era preciso reformular o elenco. Tivemos de arcar com uma folha extra. Houve quem não quisesse rescindir, claro. Outros aceitaram sair, mas tivemos de pagar parte do salário mesmo noutro clube.
Pensaste em desistir?
Sou colorado demais para isso (risos). Além do mais, era um grande desafio.
Qual foi o ponto de partida?
Fizemos uma imersão, sempre em diálogo com todos os setores do clube, para radiografar essa cena financeira ruim de 2017. Dividimos o que era imposto, fornecedor, salário. No médio prazo, buscamos estudos especializados para planejar em bases reais. No curto prazo, fizemos um esforço para renegociar as dívidas imediatas, cortar gastos e, algo essencial: otimizar custos.
Por que "essencial"?
Em 2016, nossas despesas operacionais foram de R$ 91 milhões. Reduzimos para R$ 78 milhões em 2017 e R$ 73 milhões em 2018. Só aí são R$ 18 milhões recuperados para o nosso objetivo: o futebol. Revisamos o que se possa imaginar: alimentação, limpeza, segurança, segurança, operação dos jogos.
Havia credibilidade no mercado para renegociar dívidas pela milésima vez?
Foi um complicador. Nossa credibilidade não era boa. O Inter não caiu só pelas questões do campo, mas por um somatório de processos que foram se deteriorando e afastando parceiros. Quando o rebaixamento veio, o desgaste da imagem do clube era enorme. O primeiro passo: parcelamentos longos. A reação inicial era de cara feia (risos), mas nossa réplica era boa. De que adianta renegociar em três vezes e não pagar? Alongamos para ter condições de honrar.
E deu certo?
É o que estamos fazendo, religiosamente. Não tem salário atraso ou imposto desconsiderado. O déficit anual vem caindo: 60 milhões em 2017, depois R$ 10 milhões em 2018 e, agora, a projeção de R$ 13 milhões para 2019, que pode até ser melhor.
Por que a projeção deficitária aumentou em relação ao 2018?
Por que a receita cresceu: R$ 245 milhões (2017), R$ 293 milhões (2018) e R$ 380 milhões (2019). Nosso objetivo é o futebol. Não posso só olhar para o balanço. Tem que ver o campo. Este ano havia Libertadores e mais solidez para competir. Se dá para investir um tanto mais, ótimo. Também houve valorização do elenco, a partir da volta à Libertadores, e isso tem um custo que me serve muito, pois indica time bom, que luta por títulos, e novas receitas lá na frente, como as premiações dos torneios.
A dívida total não é de R$ 350 milhões?
Não. Mais da metade disso é a questão contábil da cedência de espaços do Beira-Rio para a Brio, nossa parceira desde a reforma do estádio. São valores que entram no balanço patrimonial, mas não gastamos agora e nem gastaremos nem um centavo quando terminar a parceria. O restante está renegociado.
O Inter fecha o ano com superávit se arrecadar os R$ 52 milhões do título?
Sim. Mas nem penso nisso, sinceramente. Nem saberia te dizer de quanto seria. O título funcionaria como cartão de visitas deste processo pós Série-B, claro, mas o Atlhetico-PR eliminou Flamengo e Grêmio. É páreo duro. Temos é de seguir na reorganização em 2020, criando receitas. E reduzindo despesas não necessariamente em números absolutos, mas em relação às receitas. Insisto: nosso campeonato não é de superávit, mas de futebol. Buscamos o equilíbrio financeiro porque o sucesso do campo depende disso. Nossa obsessão era o Inter voltar a ser protagonista, e creio que chegar à uma final de Copa do Brasil é um emblema disso.