Esta semana, gravei depoimento para a RBS TV sobre um Gre-Nal inesquecível como jornalista. O meu foi um 0 a 0 no Olímpico, há 19 anos. Após anos como repórter de política, eu era um recém chegado à crônica esportiva. Embarquei nessa viagem para nunca mais sair pelas mão do David Coimbra, à epoca editor de esportes de ZH. Uma guinada de 180 graus, mas não se pode dizer não duas vezes a um grande amigo. O David já tinha me convidado para trabalhar com ele, e poderia não haver uma terceira vez.
Em março de 1997, Grêmio e Inter escalaram times vergonhosamente reservas no Gauchão. Nem lembro o motivo, mas isso não tem relevância. O importante foi a lição que aprendi: nunca, jamais, em hipótese alguma, nem que acabe o mundo, um Gre-Nal será por laranjas.
Foi o Gre-Nal dos Murilos. O do Grêmio, goleiro, pegou até pensamento. Levou nota 10 na cotação. O do Inter era um meia promissor que não vingou, baixinho, cabelo de surfista dos anos 1980, figura carimbada nas seleções da CBF. Odair Hellmann saiu jogando. Foi substituído por Sandoval. O Gre-Nal não valia nada, mas quando a bola rolou foram surgindo milagres dos goleiros, grandes lances de ataque, nervos à flor da pele e cada palmo do gramado disputado às custas de sangue e suor. Se foi assim quando nada havia em jogo, imagine o peso do deste domingo, quando quase tudo está em jogo.
O Inter pisará o gramado do Beira-Rio para seguir líder. O Grêmio, para desalojá-lo desta condição. Se o Inter ganhar, abre oito pontos sobre o Grêmio e, virtualmente, alija o rival da luta pelo título. Se der Grêmio, fica a três pontos do Inter. E as dúvidas? O Rafael Colling é testemunha. Falei no Esporte & Cia, entre narrações fantásticas de gols em Gre-Nais ao longo das décadas, ainda na quinta-feira à noite. Jogam todos: Maicon, Jael, Leonardo Moura, Luan, Leandro Damião, Marcelo Medeiros, Romildo Bolzan, até Uendel no lugar do suspenso Iago, pela hierarquia de vestiário. Já vi Felipão esconder Arce para o Inter achar que ele não havia treinado. Vi o Inter engessar a perna de Fabiano na sexta e ele correr mais do que Usain Bolt no domingo. Tudo despiste.
Os jogadores querem o Gre-Nal. Fazem de tudo para não ficar de fora. Na hora agá, como em um passe de mágica, as brumas de mistério se dissipam e todos emergem ensolarados do túnel. Somem as dores, as azias, a falta de ritmo. Quanto mais cascudos os técnicos puderem escalar, tanto melhor. Como pode uma dorzinha desescalar? A história mostra exemplos de infiltrações e até jogador em campo com os pontos da artroscopia ainda no joelho. Como Guiñazu, certa vez. Maicon já fardou com o tendão terrivelmente inflamado, sem condições.
O Gre-Nal 417 tem favorito? Não. A palavra "favorito", com Grêmio e Inter em tão boa fase, soa exagerada. Com a gangorra quebrada, não cabe. O Inter chega melhor, pela liderança e as ausências de Everton e Kannemann. Quem mais tem a sofrer com derrota é o Grêmio. Além de não voltar ao G-4, deixaria o rival disparar. O Inter, após o 2 a 1 no Flamengo, está de sangue doce. Nada a ver com a pressão do primeiro turno, quando um revés demitiria Odair. Certamente deixará a liderança se a invencilibilidade de oito jogos acabar, mas poderá retomá-la já na próxima rodada.
Empate é aceitável para os dois, mas o Inter tem mais gordura de pontos. A obrigação maior, pensando em título lá em dezembro, é do Grêmio. A Libertadores é logo ali, e o foco será dela. É urgente somar pontos agora.
Se o Gre-Nal já é pegado feito a foto de Geromel e Edenilson quando nada está em jogo, como aquele de reservas, há quase 20 anos, imagine quando uma temporada inteira pode se desenhar numa tarde de domingo.