Aconteceu algo estranho, neste tempo em que fiquei inativo: passei a gostar de Pantanal e da Dança dos Famosos. A Dança dos famosos só tem um problema: nunca conheço os famosos que dançam. Chego a perguntar para a Marcinha:
— O famoso é ele ou ela?
Ela também não sabe.
Quanto ao Pantanal, gostei da trama, embora esteja começando a se tornar óbvia, atrapalhada pela necessidade que a Globo tem de incluir pautas comportamentais na história. Mas, por enquanto, ainda me prende em frente à TV. Quando o comercial acaba, chamo:
— Marcinhaaa: começou!
O que mais gosto na novela são as pessoas que se transformam em animais. Tem uma mocinha que vira onça e um velho que vira sucuri. Algo meio X-Man. Lembra-me de um personagem de Os Cavaleiros da Arábia, que abria as mãos e gritava:
— Do tamanho de um elefante!
E ele se transformava em elefante.
Pensando bem, ninguém deve saber o que eram Os Cavaleiros da Arábia. É um desenho antigo. Daqueles em que os personagens ficavam durinhos em meio à ação. A gente gostava, porque era o que havia para ver.
Mas, voltando aos seres humanos que se transformam em bichos, eu, se tivesse esse dom, não queria ser uma fera como o tigre, nem um animal dócil como o cachorro. Eu queria ser um pássaro grande. Poderia ser um predador, como a águia, o gavião ou o falcão. Poderia ser o humilde urubu, que não goza de muito prestígio entre os humanos, com exceção dos que torcem para um time de futebol do Rio. Agora, seria uma honra virar o condor, a maior ave voadora do mundo, que pode abrir suas asas gigantescas e planar por 150 quilômetros. É como se fosse de Porto Alegre a Capão da Canoa em ponto morto, só deslizando.
Se eu fosse um condor, eu não voaria para os Andes, eu ficaria por aqui mesmo, nas cidades tumultuadas do Brasil. No entanto, voaria alto, bem alto e, lá em cima, ficaria planando preguiçosamente. Ficaria olhando o movimento dos carros que rodam entre as artérias de cimento da cidade e as pessoas atarefadas, indo a algum lugar – as pessoas sempre estão indo a algum lugar.
Mas eu, estando tão alto, não me importaria para onde fossem, nem com o que estavam pensando ou debatendo. Elas seriam apenas pessoas, para mim. Todas iguais. Elas não teriam mais problemas ou preocupações. Não teriam opinião, nem teses a defender. Só estavam ali para existir. Mas se, de repente, dois ou três humanos se desentendessem por alguma razão trivial, como o trânsito, e começassem a brigar, eu bateria as asas e subiria um pouco mais. Olharia para aqueles pontinhos lá em baixo e sorriria de prazer. A vida aqui em cima é tão pacífica...