Muitas coisas do mundo, para existirem, dependem da crença.
O dinheiro.
O dinheiro só existe porque você acredita nele. Se não acreditasse, não passaria de um pedaço de papel. Você vai à fruteira com uma nota de cem reais para comprar, sei lá, pêssegos:
— Dou cem reais por uma dúzia de pêssegos.
O dono da fruteira ri:
— Um papel pelo meu pêssego? O que vou fazer com esse papel? Não aceito.
Você poderia argumentar que aquele papel vale 50 pêssegos. Se ele não acreditasse nisso, não faria diferença. E, se ninguém acreditasse, você ficaria com fome e com uma nota de cem reais inútil nas mãos.
Hoje em dia o dinheiro é, por ironia, ainda mais imaterial. Você não pega um saco de dinheiro e leva ao banco para abrir uma conta. Você “deposita” ali algo que o seu empregador jura que pagou pelos seus serviços. É um número. E, depois, quando você quer comprar pêssegos, você não dá ao dono da fruteira nota alguma; você apresenta um cartão que garante que você tem dinheiro na conta. Ou “faz um Pix”, que é ainda mais intangível.
No Brasil, há leis que “não pegam”. Por quê? Porque ninguém acredita nelas.
No Brasil, a verdade dança conforme as conveniências. A Lava-Jato provou que o governo federal comandava um esquema de poder e corrupção que roubou bilhões dos cofres públicos. Prova mais que provada: outros bilhões devolvidos, fotos, e-mails, telefonemas, testemunhos, algo exaustivo, concreto e assustador. Mas o amor dos brasileiros pelos políticos fez parte da população absolver os culpados e culpar os agentes da lei.
Ou seja: grande parcela dos brasileiros acredita incondicionalmente nos políticos e não acredita em nada que os desabone. Os políticos são seus ídolos, são deuses, são intocáveis.
O que quero dizer é que a fé é maior do que a realidade. Você pode ter todas as provas científicas, matemáticas, inquestionáveis de uma verdade. Se as pessoas não acreditarem nelas, você não tem nada.
Faço essa consideração a respeito do novo filme da Netflix Não Olhe Para Cima. É uma paródia dos tempos em que vivemos. Quase uma comédia. Dois cientistas descobrem que um cometa maior do que o Chicxulub, que extinguiu os dinossauros há 66 milhões de anos, vai colidir com a Terra dentro de seis meses. O impacto será suficiente para acabar com toda a vida do planeta. Eles, então, tentam convencer o mundo a se unir para enviar foguetes que explodam o cometa no espaço. Só que muitos não acreditam neles, então a discussão se torna política: há os que acreditam na ciência e os que não acreditam. Há os que querem se precaver e os que dizem que tudo é manipulação movida por interesses.
O mundo está prestes a acabar, mas a Humanidade não para de discutir, lançar memes na internet e acusar-se mutuamente. É o retrato dos nossos negacionistas, que conseguem a façanha de boicotar a vacina contra a covid em nome de suas crenças políticas. O que fazer para salvar o mundo? Não há o que fazer. Eles creem e, como já disse, a crença é maior do que a realidade. É maior do que a inteligência.