Já devia ter escrito sobre o show do Caetano Veloso. Devia. Mas as informações e as vontades são tantas e vão se sobrepondo, e acabei esquecendo. Agora, hei de me redimir, porque a live do Caetano foi um acontecimento.
Escrevi “live”, quando, na verdade, deveria ter repetido “show”. Pois foi isso mesmo, foi um show especial. Caetano estava sozinho no palco de um teatro vazio, coisa que, por si, já é rara. Mas, para acrescentar em originalidade, a iluminação era de um espetáculo normal e ele cantava como se fosse um espetáculo normal. Falava com as pessoas que o assistiam de suas casas como se elas estivessem a metros dele e ele pudesse vê-las. Em certo momento, chegou a pedir que todos cantassem uma música em coro.
Foi um show minimalista, apenas voz e violão, mas, ao mesmo tempo, grandioso, com sua iluminação perfeita e o perfeito timing do artista. Entre uma música e outra, Caetano falava com voz suave, passando uma sensação de paz a quem o ouvia. Era bom não apenas de ouvi-lo cantar, mas também de ouvi-lo falar. É bom ver um homem satisfeito com o que é e com sua própria vida.
Mas o que mais gostei, no show do Caetano, foi algo sutil, que só se podia perceber lateralmente: ele parecia nervoso.
Isso me deixou encantado.
Caetano faz shows há mais de 50 anos. Nesse meio século, exibiu-se em tudo que é tipo de palco, em toda parte do mundo. Mas uma apresentação que ele fazia sozinho com seu violão o fez estremecer. Foi uma revelação: mostrou que Caetano se importa com o que está fazendo. Com quase 80 anos de idade, tendo dinheiro suficiente para se aposentar e viver se embalando na rede de uma praia de Salvador, consagrado no planeta inteiro, ainda assim Caetano queria dar o melhor que podia. Foi bonito fazer essa constatação. Porque, afinal, ele queria, e ele conseguiu.
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O CACHORRO-QUENTE QUE NOS UNE
Morreu o inventor do cachorro-quente do Rosário. Chamava-se Osmar Ferreira Labres, algo que, confesso, consternado, só descobri agora, ao ler no jornal a notícia de seu falecimento. Nós, porto-alegrenses, somos de fato injustos com os grandes personagens da cidade. Somos iconoclastas demais, cínicos demais.
Devíamos ter reverenciado Labres enquanto ele vivia. Eu mesmo devia saber-lhe o nome de cor. Poderia ter informado aos turistas que levasse para provar o cachorro-quente do Rosário:
_ Vais experimentar um cachorro-quente único. Um molho diferente de todos os outros. Quem criou foi o Labres.
Afinal, não são muitas as nossas originalidades. Do que o porto-alegrense realmente se orgulha é dos seus times de futebol e dos seus políticos, e até acerca deles a cidade é dividida.
Então, são poucas as colas que nos unem. Uma dessas, um singelo cachorro-quente. Mas não qualquer cachorro-quente, e sim um do tipo que só se faz aqui, com os exageros e os excessos típicos da cidade. O cachorro-quente do Rosário faz sucesso porque fala ao cidadão de Porto Alegre.
Temos de saudar o que nos distingue de outros povos, temos de procurar outros elos que possam nos unir. Porque, brigar por política e futebol, todo mundo briga.