Agora mudou o tempo em Porto Alegre. Deu uma esfriadinha. Não frio, que aqui, já disse, não faz frio; aqui a gente sente frio.
Frio, mesmo, acontece no norte do mundo, aquelas temperaturas abaixo de zero, aquele vento que fatia. Você sai ao sol e é como se estivesse à sombra, é um sol que não esquenta. Sabia que nevou, nesta sexta-feira, em Boston? Neve em outubro é um assustador prenúncio de inverno. Em geral, o frio começa apenas depois do Halloween, e sem neve. Neve é coisa dos dezembros dourados, que, lá, são brancos.
Mas, ao fim e ao cabo, não interessa, não é? Interessa é como você se sente. Se você está sofrendo com o frio, pouco importa se está na África ou no Alasca, pouco importa se os outros acham que faz calor. Você é que está sentindo, você é que tem de resolver o problema.
É o que digo acerca da dor: você não pode medir a dor do outro. Só pode medir a sua, e, ainda assim, usando como parâmetro dores que já sentiu.
Nos Estados Unidos, os médicos têm o hábito de perguntar qual é o tamanho da sua dor. Assim: você passa por uma cirurgia e, no primeiro dia de recuperação, que é o pior dos dias, está todo ruim. Aí o médico vem e indaga: “De zero a 10, qual é a nota da dor que você está sentindo?”. Zero, evidentemente, é nenhuma dor. Dez é toda a dor.
Já tive dores nota 10, mas não sei se isso é razão de orgulho. O médico perguntava qual era a avaliação da minha dor e eu lembrava do Carlos Imperial na apuração das escolas de samba do Rio: “Déish! Nota Déish!”.
Só que essa tabela é relativa. Uma dor que para os outros parece ser irrelevante, para você pode ser excruciante. O outro olha para o seu dedo minguinho inflamado e diz: “Ah, isso não é grande coisa, é só um minguinho”. Mas, para você, é insuportável. Para você, nada mais existe. Aquele minguinho se transformou no centro da sua vida, no coração do mundo, você só pensa no seu minguinho.
Assim é, também, a dor da alma. Respeito os sofrimentos existenciais e nunca digo que padecer por esse ou aquele assunto é bobagem. Só você pode dar nota para a sua dor.
No entanto, houve algo que aprendi a respeito de dores: quanto mais você se queixa, mais dói. Porque aí aumenta o valor da dor. É um processo natural, quase uma ação de marketing. Quando você fala muito numa coisa, ela se torna mais importante. A dor tinha levado nota 3, mas, depois de você tanto discorrer sobre ela, ela ganhou notoriedade e fama, a nota subiu, agora é 6, é 7. Daqui a pouco, torna-se intolerável.
Digo isso porque tenho uma dúvida: será que não nos queixamos demais? Será que, às vezes, não seria melhor ir em frente do que ficar parado, reclamando?
Não é possível que tudo seja sempre tão ruim. Não é possível que todos sejam tão maus. Tenho a impressão de que nós, brasileiros, gritamos demais, falamos demais das nossas dores. Podemos sofrer menos, se quisermos. Nem toda dor merece nota 10.