“De que adianta?”, ouço as pessoas perguntando.
É a frase mais repetida, pelas ruas da cidade: “De que adianta?”
Os gaúchos desanimaram, no combate ao coronavírus. Não acreditam mais que as medidas de cautela que venham a tomar possam evitar a doença. “Nós já fizemos tudo que disseram para fazer”, suspiram. “E, em vez de melhorar, piorou”.
Esse desalento era previsível. No dia 2 de julho, o governador fez um discurso emocionado, conclamando a população para mais duas semanas de sacrifício. Segundo ele, seriam as semanas decisivas na luta contra a doença. Naquele mesmo dia, publiquei uma coluna analisando o discurso e o classifiquei de “perigoso”. Pela seguinte razão: o período crítico da doença vinha sendo adiado desde abril. Eram 15 dias de esforço, depois mais 15, depois mais 15. Escrevi:
“Essa é a aflição de Eduardo Leite. Se daqui a 15 dias ele não puder dizer que a maior ameaça foi debelada, não haverá discurso, por mais bem amanhado que seja, capaz de convencer as pessoas de que elas terão de suportar outros 15 dias de sacrifícios”.
Hoje, muita gente festeja os governantes, enquanto culpa a sociedade pelo aumento de casos e de mortos. Os gaúchos não teriam disciplina, não teriam prestado obediência a seus guias iluminados, por essa razão a doença recrudesceu. É mais do que uma injustiça: é uma crueldade.
Em primeiro lugar, porque o comportamento da doença é geográfico: ela migrou para os Estados do Sul e para outros em que havia poucos casos, como Minas Gerais e Mato Grosso. Isso não aconteceu por mau comportamento dessas populações. Aconteceu porque havia espaço para o vírus se disseminar.
Em segundo lugar, porque o abrandamento das medidas cautelares não se dá apenas por cansaço ou rebeldia: se dá porque os recursos para a resistência foram exauridos em quatro meses e meio de luta. Acabou a munição. E o controle da munição compete exclusivamente aos comandantes, não aos soldados.
Muitos setores da sociedade poderiam funcionar com restrições, em grande parte desses quatro meses e meio. Isso daria mais fôlego à comunidade. Essa não é uma corrida de cem metros; é uma maratona. Se o corredor forçar muito o ritmo no começo da maratona, não vai terminá-la. Ficará no meio. Bem. Nós estamos no meio.
Ainda há um longo trecho para concluirmos a prova. O que faremos para chegar bem ao final? Teremos de esquecer os erros que foram cometidos. Teremos de relegar as promessas vãs e as desilusões. Teremos de cuidar de nós mesmos.
Em março, abril e maio, se você saísse às ruas veria sete entre 10 pessoas usando máscara. Hoje é o contrário: de 10 pessoas, três estão com máscara. Isso é algo que podemos fazer sem grande sacrifício. Se você tem de sair, porque precisa sobreviver, que seja de máscara. Você pode usar máscara e cobrar de quem não usa. Faria diferença. O vírus está entre nós como jamais esteve. Temos de vencê-lo. Não é hora de pensar em culpas. É hora de pensar em soluções. Essa é uma delas, e nem é tão ruim assim: use a maldita máscara!