No princípio desta confusão causada pelo coronavírus, perguntei para a minha amiga Neca Barreto, que é uma das melhores médicas que há, que houve e que haverá:
– O que tu preferias enfrentar: um vírus minúsculo ou um dinossauro gigantesco?
Ela, destemida que é:
– Um vírus! Com o dinossauro eu não posso; com o vírus, posso.
Tenho de perguntar se a Neca continua com a mesma opinião.
Nós, seres humanos, nunca enfrentamos dinossauros. Eles desapareceram antes que nós aparecêssemos. Mas somos bons com bichos grandes. Se manadas de dinossauros invadissem as cidades, não nos esconderíamos em casa, como estamos fazendo com o corona. Eles seriam recebidos por tanques e bazucas e logo estaríamos assando suculentos churrascos de brontossauro, como os Flintstones.
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Isso é terrível: um vírus pequeno, que nem se vê a olho nu, não pode ser morto nem à bala. Que frustração para os armamentistas. O que destrói o vírus, vejam só, é sabão e álcool gel, tão suaves, tão aparentemente inofensivos. A espuma farta do sabão dissolve a gordura que envolve o vírus e ele falece antes de poder entrar em alguma de nossas queridas células.
Então, nada de tresoitão, nada de AK-47, precisamos é de água e sabão. E paciência. A rotina do descoronamento das coisas é muito aborrecida, tenho de dizer. Aqui em casa, nós temos um método: a Marcinha chega com as sacolas de compras do supermercado e nós as levamos direto para o tanque, que se transformou em uma sala de descontaminação. Temos que lavar tudo antes de colocar na geladeira. Enquanto lavo, fico imaginando os coronas gritando ao contato com o sabão mortal e seus corpos rolando ralo abaixo.
– Vão, desgraçados! – grito. – Desapareçam feito dinossauros!
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Paciência. Sei que é assim em toda parte. Li que 4 bilhões de seres humanos estão passando por algum tipo de restrição devido ao coronavírus. É mais da metade da população mundial afetada. Na verdade, todos os países estão atentos, todos os governantes estão em estado de alerta, tentando seguir as orientações de autoridades da área da saúde como o ministro Mandetta.
Todos, menos três.
Um é o presidente de Belarus, que diz que a vodca mata o coronavírus.
Outro é Gurbanguly Berdymukhamedov.
Quem é mesmo Gurbanguly Berdymukhamedov?
Ora, é o presidente do Turcomenistão, é claro.
Gurbanguly governa o país há 14 anos e não tem data para sair. Trata-se de um homem aferrado ao poder e muito supersticioso. Acredita, por exemplo, que a cor branca traz sorte e a preta, azar. Por isso, baixou uma lei que proíbe carros pretos no Turcomenistão. Quem tinha carro preto teve de repintá-lo de branco ou cinza.
No combate ao coronavírus, Gurbanguly foi ainda mais assertivo: ele simplesmente proibiu o vírus no Turcomenistão. Isso mesmo: nenhum órgão de imprensa está autorizado a publicar a palavra “coronavírus”, ninguém pode pronunciá-la em rádio, TV ou pela internet, e até nas conversas privadas um cidadão pode ser preso se falar o malévolo nome interditado.
Desta forma tão prática, o coronavírus foi banido do Turcomenistão sem que se tivesse de usar água, sabão, álcool gel ou os tanques do exército.
Muito engenhoso.
Já o terceiro governante que destoa de todos os outros mandatários do planeta e hesita em seguir as determinações das autoridades sanitárias, chegando ao ponto de anunciar a futura demissão do seu ministro da Saúde, este governante quem é? Quem?
QUEM?
Jair Bolsonaro, é claro!
Mas, por alguma razão, Bolsonaro não pensou em proibir o corona. Em vez disso, ele está chamando a população para rezar e jejuar. Ou seja: transferiu a tarefa para Deus. Pode dar certo. Como está dito na cédula do dólar americano, em Deus nós confiamos. Em certos governantes, não.