O podcast é um programa de rádio portátil.
Aliás, antes de mais nada, preciso ressaltar que nutro sincera simpatia por esse termo, “portátil”. Trata-se de uma palavra que servia para designar algo novo e que envelheceu precocemente, como “calça de brim”, “frigidaire” e “matéria plástica”.
Calça de brim, você sabe, é a nossa ubíqua calça jeans. Até os anos 70, os brasileiros falavam “brim” por causa de uma fábrica de calças paulista que produzia os “Brins Coringa”. As pessoas diziam:
– Tenho que comprar um Brim Coringa.
Falavam tanto em Brim Coringa, Brim Coringa, Brim Coringa, que eu pensava ser uma palavra só: brincoringa.
O curioso é que o nome correto do tecido, “jeans”, não veio dos Estados Unidos, veio da Itália. Descobri isso anos atrás, ao ler sobre a Corrida do Ouro. Farei um resumo rápido: no meio do século 19, quando os americanos estavam acometidos pela perigosa febre do enriquecimento rápido, arrancando metais preciosos da terra da Califórnia, um alemão chamado Levi Strauss percebeu que os mineiros se queixavam muito da fragilidade de suas calças. Elas se rasgavam e puíam com facilidade na lida diária. Então, ele tomou de lonas que deveriam servir para fazer barracas e com elas costurou calças. Ofereceu-as aos mineiros, que as aprovaram de imediato. Era daquela robustez que necessitavam. Mas as calças de lona tinham um problema: eram incômodas, tolhiam a mobilidade do trabalhador. Strauss, assim, saiu a pesquisar tecidos que possuíssem a mais importante reunião de qualidades que quase tudo deve ter, inclusive os seres humanos: a resistência acoplada à flexibilidade.
Strauss descobriu o que procurava na sua velha Europa, mais especificamente em Gênova, onde operários e pescadores já vestiam roupas feitas com um tecido forte e maleável. Esse tecido era azul, de um tom chamado “azul genovês”, ou “genes”, que os americanos pronunciavam… “jeans”! Donde o “blue jeans”.
Levi Strauss ficou riquíssimo vendendo suas calças de azul-genovês, bem mais do que os mineiros que se esfalfavam com suas bateias e picaretas, o que mostra que as grandes oportunidades da vida às vezes são alcançadas por caminhos vicinais, e não pelo engarrafamento das grandes estradas.
Com outra palavra que citei, frigidaire, deu-se o mesmo fenômeno do Brim Coringa: era marca; virou sinônimo. No caso, de geladeira. A pronúncia é francesa, requintada, meio esnobe: “frigidérr”.
Já a “matéria plástica” foi simplificada e virou plástico mesmo, mas, antes disso acontecer, corremos o risco de a tão abrangente e útil palavra “matéria” tornar-se definição de plástico.
Uma vez, lá em Cachoeira do Sul, um dos amigos do bloco Alá-lá-ô apareceu vestindo uma calça feita de um tecido sintético, uma imitação de couro, sei lá, só sei que um outro amigo olhou maliciosamente para ele e comentou:
– Hmmm, calcinha de matéria?
Felizmente, hoje plástico é plástico e matéria é um monte de coisas.
Mas o que interessa aqui é que essas palavras surgiram de repente, foram içadas a enorme popularidade e, também de repente, viraram obsoletas.
São como a lambada, as músicas do RPM, a leva-tudo e os romances de Sidney Sheldon.
O sucesso universal que faziam é incompreensível hoje em dia.
O que torna algumas coisas clássicas e outras ultrapassadas? Essa pergunta eu iria tentar responder quando comecei a falar do podcast, esse programa de rádio portátil. Mas tergiversei, terei de concluir amanhã. Tenha, por favor, paciência, essa virtude dos homens superiores.