A secretária do Planejamento e Orçamento do Estado, Leany Lemos, escreveu uma divertida resposta à minha coluna "Por que há tantas farmácias no Rio Grande do Sul?". Gostei muito e compartilho com os leitores:
"O Timeline deve ser o único programa no Brasil em que você vai falar de déficit orçamentário e reforma da Previdência, mas acaba dando risadas e defendendo a livre e irrestrita reprodução do ser humano. Aconteceu comigo outro dia! Pois o David Coimbra até escreveu em seguida na sua coluna. Ficou impressionado pelas questões demográficas que afetam o Brasil, e em especial o Rio Grande: há aqui um fluxo migratório negativo (mais gente vai embora do que vem) e baixa taxa de natalidade. Daí fez uma longa, divertida e profunda (teve até Schopenhauer) defesa de um Rio Grande para maiores de 60, já que, em 2030, 1/3 da população do Estado estará nessa faixa etária. E viva o sopesamento, as boinas, a temperança, a paz da maturidade, os jogos de dama na praça, se regozijou David! Abaixo o sexo, a reprodução, os arroubos da juventude e o sofrimento da humanidade (que aos poucos, viva, desaparecerá, humanidade e sofrimento juntos!).
Eu já tinha discordado à vista, tenho agora de discordar a prazo. Não que não goste da maturidade chegando e reinando sobre nós. Eu serei uma dessas sessentonas de 2030. Gosto de sofrer menos, de entender que na vida ganhamos e perdemos, amamos e desamamos, refazemos rotas, e está tudo bem. Aprendemos que a morte é da vida, que os filhos não são nossos, que precisamos mais das pessoas e do afeto que de coisas, títulos e posições. É uma beleza ter cabelos brancos. Há três anos não pinto os meus, resistindo à pressão das amigas, que me acham muito jovem para desistir de ser jovem. Mas os 139 fios da minha fronte me lembram de tudo que já aprendi e que me moldou (confesso que vivi, diria Neruda!). Não abro mão. Adoro andar em casa de meias com pantufas, e uso amarelo com roxo, pouco me importa a opinião alheia, algo que jovem não fazia. Era preto, bege, marrom e cinza, coitada da gente jovem, sempre pensando o que pensam de ti. Era menos desaforada. Mais tímida. Mais medo. É boa, a maturidade. Só que, como secretária sisuda, não deixo de pensar nos desafios para as políticas públicas que representa uma população mais velha. É a Previdência, o sistema de saúde, a organização das cidades, a mobilidade urbana. Milhares de desafios.
E, de outro lado, como não amar também a juventude, o arroubo, a pressa de ser, a certeza de tudo, a capacidade de acreditar no impossível, de se deslumbrar a cada cinco minutos com o mundo, de desejar tudo-ao-mesmo-tempo-aqui-agora? Aquele brilho nos olhos. Você sabe que a criatura vai se dar mal ali na frente, mas vá lá, deixa a pessoa, esse brilho não tem preço. E a pele, MEU DEUS! Ter os dois mundos está na beleza da existência. O arroubo e a temperança, a boina e a cabeleira, os cardigãs e os moletons, o Rei e o rock. Eu não quero uma fila de gente igual a mim... Nem os bares substituídos só por farmácias. Além disso, quem vai me ensinar a usar toda essa tecnologia que muda duas vezes por semana? Preciso de mentores. Os guris hoje já nascem dando assistência técnica. E, por fim, mas não menos importante, falando dos mais pequenos - quem não acha aquelas bolas fofas a melhor coisa do universo? Mesmo que seja pra olhar de longe. No Instagram dos amigos. Fofos. O filho de uma amiga, quando perguntado pra que servem as crianças, me respondeu rapidamente: para trazer alegria. É claro que trazem preocupação, chateação, pressão, gastação, mas trazem alegria inquantificável. Nos fazem rir de coisas ridículas, sem serem ridículos ou nos fazerem de ridículos. É uma mágica da vida.
Agora, voltando ao meu papel chatinho: sorry, Rio Grande, capital humano é fundamental para o crescimento da economia, e mesmo com os ganhos de produtividade que a tecnologia possa aportar, sem a reposição de pessoas fica difícil crescer, até porque a produtividade no Brasil já é muito baixa. Os países ricos resolvem o problema parcialmente com a tecnologia e com uma boa educação do seu povo, mas também dependem da imigração. Apesar do sentimento anti-imigrantes na Alemanha, como exemplo, recentemente aprovaram uma lei de atração de trabalhadores qualificados. E estudo da Bertelsmann Foundation aponta que em 2035 a Alemanha deverá precisar de 98 mil imigrantes a mais; em 2051, quase 200 mil. Isso para não perder competitividade. É essencial ter uma força de trabalho robusta. Seja com reprodução, seja com migração. Aqui não será diferente.
David, falei tanto de outras coisas que faltou falar de sexo. Mas aí não é tema pra secretária de Planejamento e Orçamento, nem combina. Embora eu ache que a gente tenha de buscar a alegria, a leveza, o amor, já que problema vem sem ser convidado. Então, David, deixa o pessoal se divertir. Em qualquer idade, a qualquer tempo, do jeito que o coração mandar!”