Aliado de primeira hora do prefeito Nelson Marchezan, o vice Gustavo Paim dá sinais de que as relações estão deterioradas a ponto de considerá-las rompidas. O distanciamento começou com diferenças públicas entre o partido do vice, o PP, na votação do projetos na Câmara de Vereadores e teve o ápice da crise há algumas semanas, quando o prefeito demitiu todos os cargos de confiança da sigla, entre eles o chefe de gabinete de Paim. Na época, em férias nos Estados Unidos, o vice emitiu uma nota classificando a postura do prefeito como “desleal”. De volta ao Brasil, Paim sentiu que o caldo entornou de vez.
Confira a entrevista
Como está sua relação com o prefeito Nelson Marchezan?
Virou uma relação mais institucional e protocolar. É um convívio que foi mudando ao longo do tempo pelas dificuldades de relacionamento entre o prefeito e o PP. Várias questões foram acontecendo e, em um dado momento, era o único que estava tentando lutar para que ainda se fizesse o diálogo. Um amigo me disse uma frase que representa muito bem a situação: eu era uma ponte sobre um rio que já secou. Ou seja, por mais que me esforçasse para que (a relação) desse certo, já não havia mais interesse daquilo acontecer e, portanto, era uma energia desperdiçada.
O senhor conversa hoje com o prefeito?
Quando nos encontramos eventualmente. Tem uma questão que, para mim, é fundamental, que é educação, respeito e a questão institucional. Tanto eu quanto ele representamos uma institucionalidade.
O PP hoje exerce oposição ao governo. Causa algum desconforto para o senhor?
Sou filiado ao partido há 23 anos. E tenho orgulho de dizer que temos uma lógica de horizontalidade (nas decisões). É um partido que tem respeito e democracia interna. Agora que o partido foi alijado do governo, há um sentimento maior de união e aproximação dentro do PP.
Quando começamos a perder espaços de decisão, a perder o protagonismo de poder cumprir o compromisso com os eleitores, isso naturalmente vai gerando afastamento e caminha para acirramento posterior.
Atualmente, existe alguma possibilidade de reconciliação com o prefeito?
Primeiro, é importante lembrar que o apoio do PP na eleição do prefeito foi absolutamente decisivo. Pela história, pelos prefeitos que já tivemos e pelo resultado da eleição, elegemos quatro vereadores, o PSDB, um. Isso demonstra a representatividade que o PP tem. O partido foi sendo alijado de espaços decisórios da prefeitura. Quando isso acontece, não conseguimos implantar aquilo que havíamos nos comprometido com o eleitor.
O prefeito justifica as demissões de cargos do PP dizendo que o partido passou a ser oposição.
Não era ao longo do tempo. Mas quando começamos a perder espaços de decisão, a perder o protagonismo de poder cumprir o compromisso com os eleitores, isso naturalmente vai gerando afastamento e caminha para acirramento posterior.
O senhor cita bons exemplos da gestão atual. Mas diz que qualquer coisa é motivo de conflito. Por quê?
Há em Porto Alegre um projeto que dialoga muito com o conteúdo programático do PP. São as parcerias público-privadas, não ter preconceito com isso, ser amigo do empreendedor, ter concessões, privatizações, retomar o espaço público. Isso foi algo que me orgulho muito porque desde o início do governo ajudei a liderar a recuperação da Orla. Mas, muitas vezes, as entregas são menores em termos de quantidade ou mais demoradas por uma instabilidade na condução por excesso de beligerância, de atritos e de conflitos.
Provocados pelo prefeito?
Há ideias boas. E, na prática, conseguir fazer com que elas sejam viabilizadas envolve muito diálogo e inclusão. E não exclusão, conflito. E isso ocorre pela maneira como se dá a condução. Não gosto de atribuir culpas ou responsabilidades. Repito, tem ideias boas, mas Porto Alegre precisa de uma prática mais harmoniosa, que devolva a pacificação para a cidade ser menos conflituosa.
Um dos casos de conflito desnecessário foi a remoção das casinhas de cachorro, cuja insistência no tema pela prefeitura gerou repercussão maior?
Gestão pública é ter decisão. Muitas vezes, não são fáceis. Podem gerar algum conflito, mas tu tens convicção de que precisam ser tomadas. Mas não pode sentir prazer ou ter qualquer sentimento de “olha, agora eles estão vendo quem manda”. Não pode existir qualquer sentimento que envolva a adversidade. É uma decisão que precisa ser tomada pela responsabilidade do gestor público. A energia dos governos tem de ser colocada naqueles conflitos que são necessários. Nas casinhas dos cachorros, vejo um dentre tantos episódios que me parece muito mais o conflito pelo conflito, do que qualquer objetivo público de interesse do cidadão, de cuidar de Porto Alegre.
Na votação do IPTU, o prefeito criticou a postura de partidos da base, entre eles o PP. É um exemplo de beligerância?
Nos impediu de aprovar o projeto antes.
A cidade é bem conduzida?
Temos na prefeitura muitas pessoas boas e projetos que estavam parados no tempo e que precisavam ir em frente. Isso está acontecendo. Mas, quando se faz isso com excesso de conflitos, alguns necessários, mas muitos desnecessários, o que tira a concentração da energia naquilo que é necessário, gera atrito e uma resistência maior do que a resistência natural que possa existir. É uma espécie de mau humor coletivo em razão da forma de condução. Acho que Porto Alegre merece uma condução com mais diálogo, com mais inclusão, com menos autoritarismo.
No ano que vem, podemos ver prefeito e vice disputando a prefeitura?
A história do PP nos orgulha muito, pois quando se fala em (Guilherme Socias) Villela e (João) Dib, sempre se fala com nostalgia de algo positivo. Porto Alegre precisa de uma pacificação, da busca de equilíbrio e de alguém que se preocupe com o futuro e com ideias e lógica que coloquem a cidade no século 21, mas sem esquecer de cuidar do dia a dia da cidade e dos porto-alegrenses. Essa é a razão do governo. O PP tem esse interesse e se apresenta como uma alternativa. A questão de nome é muito menos uma vontade pessoal e muito mais uma construção do partido. Precisa ser uma decisão partidária.
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