Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) surgiu em 2007 com o objetivo de transformar o país em um canteiro de obras, com projetos que prometiam investimentos de meio trilhão de reais. Três anos depois, foi lançado o PAC 2, com indicativo de aporte de mais recursos em novas obras. De fato, muitas saíram do papel. Outras, mais precisamente 4.669 em todo Brasil, ficaram para trás.
O levantamento foi divulgado recentemente pela Câmara Brasileira de Indústria da Construção, que pressiona o governo federal pela retomada das construções que começaram e ficaram pela metade. O Rio Grande do Sul tem 312 obras inacabadas — na maioria dos casos, unidades básicas de saúde, creches e pré-escolas — um verdadeiro "cemitério de obras", segundo o vice-presidente de infraestrutura da CBIC, Carlos Eduardo Lima Jorge.
Qual é a grande preocupação do setor?
O Ministério do Planejamento indicou, ainda no ano passado, que existem 4.669 obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) paralisadas. Nesse ano, com um governo assumindo e tendo como uma das metas a elevação do nível de emprego, identificamos uma excelente oportunidade para contribuir, como setor, para a retomada da atividade econômica. Fizemos um diagnóstico e selecionamos uma amostra de mil obras, do total de 4.669, e fomos atrás de todas as informações para entender os motivos que levaram às paralisações. Também foi feita pesquisa separada com amostra de 500 unidades básicas de saúde (com obras paradas).
Por que as obras estão paradas?
Como víamos que a maioria das justificativas nos sites oficiais era "outros motivos", fizemos esse aprofundamento. O PAC foi lançado em janeiro de 2007 com meta de atingir nada menos que R$ 500 bilhões de investimentos em quatro anos. (Depois), lançaram o PAC 2 com meta R$ 955 bilhões até 2014. Com esse volume e diversidade de obras anunciadas, não foi criado em tempo adequado todo o processo normativo para dar suporte operacional a esse programa. Ao longo da execução do programa é que foram sendo criadas instruções, portarias e decretos para regulamentar a operação. Isso causou uma série de problemas.
Muitas empreiteiras quebraram em razão da interrupção dessas obras?
A grande maioria das obras (paradas) é de pequeno porte e isso envolveu grande número de empresas de pequeno porte. Elas não chegaram a quebrar, mas tiveram resultado negativo para o setor em termos de faturamento e dispensa de empregados. Houve descasamento entre o volume de coisas que foi anunciado e as normas existentes. O segundo descasamento foi financeiro. Na realidade, foram assinados convênios Brasil afora que geraram programas e contratos, sem a disponibilidade financeira para atendimento. Um exemplo: o governo Dilma assinou com a prefeitura de São Paulo (o chefe do Executivo era Fernando Haddad) R$ 8,1 bilhões de convênios para a geração de obras. O que chegou de fato ao caixa da prefeitura de São Paulo foram R$ 500 milhões. Isso gera esse cemitério de obras que a gente vê pelo país.
Prometeram, assinaram e não entregaram?
Não entregaram. No final de 2016, levantamento tanto do PAC 1 quanto do PAC 2 mostrou que o governo tinha cumprido 56% das metas de entrega de obras. Esse conjunto está funcionando como patinho feio: o governo sabe que existe, sabe que está lá, que é um parque de obras inacabadas, mas não está tendo comando ou decisão política de enfrentar esse problema. Existem vários núcleos se preocupando com esse tema, mas que não conversam entre si. Um exemplo: umas das primeiras providências do ministro Dias Toffoli quando assumiu o Supremo (Tribunal Federal) e o Conselho Nacional de Justiça foi criar equipe dentro do CNJ para tratar de obras paralisadas. O Ministério de Desenvolvimento Regional tem um departamento e deslocou pessoas para cuidar de obras paralisadas, o Senado tem um grupo que analisa essa questão e o Tribunal de Contas da União também tem uma atuação investigativa sobre obras paralisadas. Só que não conversam.
Existe alguma sinalização do governo de que as obras podem ser retomadas?
O primeiro passo seria uma força-tarefa que esperamos que seja centralizada na Secretaria de Governo porque dá um caráter de prioridade executiva para o governo fazer uma análise. Não existe bala de prata, uma única solução para retomar todas as obras. Existem vários casos que acarretaram a paralisação e para cada grupo é um tipo de saída. Detectamos que, dessas 4.669 obras, 1,7 mil eram Unidades Básicas de Saúde, a maioria concentrada no Nordeste, mas tem no Sudeste, Sul etc. São obras de baixo investimento, de R$ 500 milhões. Não é uma grande obra. Em média, estão 70% executadas. O que verificamos como razão de paralisação é que o município assinou o convênio e estava executando a obra quando percebeu que o custeio iria caber à prefeitura. Então, paralisa a obra e ela fica lá. No caso das UBS, o que estamos propondo é que se faça um estudo de modelagem em que a prefeitura possa entrar como contrapartida com a parte já executada, e oferece o término da obra e a exploração à iniciativa privada. Estimulamos que seja feito isso nessa força-tarefa. Estamos falando de 1,7 mil unidades de saúde espalhadas pelo país na área que o Brasil é extremamente carente.
Quanto custa a mais interromper uma obra e retoma-la depois?
Por exemplo, quando uma obra em uma rodovia para, ela se deteriora. Em um tempo muito grande, passa de manutenção à recuperação de pavimento. Passa a custar de 28% a 30% mais. Em uma edificação, dependendo do tempo de paralisação, você tem uma deterioração. E em uma paralisação de dois, três anos, você tem em torno de 30% de custo adicional para terminar a obra. Como a gente sabe que o governo não tem dinheiro, nenhuma das propostas que fizemos é para a injeção de novos recursos. Não adiantaria, nessa toada que estamos vendo no Ministério da Economia de contingenciamento, nos apoiarmos em recursos públicos.
Como se chegou a estimativa de geração de 500 mil empregos com a retomada das obras?
A cada milhão investido no setor de construção civil, você tem a geração de 11,4 empregos diretos e indiretos. Então, fizemos estimativa até conservadora de uma parcela dessas obras que conseguir ser retomada, e a geração seria de 500 mil empregos, entre diretos e indiretos. Quando falo indiretos, são os fabricantes de materiais e equipamentos que são acionados e geram emprego a partir das obras. Óbvio que teriam mais empregos que não estão computados aqui, como médicos, enfermeiros e professores que seriam contratados ao término dessas obras.
De que forma a repercussão sobre a Lava-Jato interferiu nessa situação?
Uma das razões de faltar recursos para terminar várias obras do PAC foram os motivos levantados pela Lava-Jato. Houve grande concentração de recursos e de financiamentos em grandes projetos para grandes empresas. Várias das empresas médias durante aquele período tinham dificuldade enorme de conseguir financiamento. O governo não pode jogar luz apenas sobre esses empreendimentos estruturais que demoram mais tempo e são mais complexos, e esquecer o patinho feio, que são as 4,7 mil obras paradas no país.