
A crise financeira das prefeituras gaúchas se agravou e está colocando as administrações em um "estado de falência". A avaliação é do presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, que, nos últimos 20 anos, tem se dedicado a defender os interesses das prefeituras – antes, ele foi presidente da Federação dos Municípios do RS (Famurs).
– Acabou a era do "almoço grátis", de fazer populismo com dinheiro público – diz.
Postos de saúde fechados, ruas esburacadas, falha na coleta de lixo e atraso de salários... Na entrevista a seguir, Ziulkoski explica a origem da crise e fala sobre os efeitos que ainda estão por vir.
As dificuldades financeiras das prefeituras são conhecidas. Mais problemas vão surgir?
Muitos mais. Com a crise fiscal do governo federal, a União teve de suspender transferências e não vai corrigir programas que mantém com as prefeituras. Soma-se a isso a crise do governo estadual gaúcho... Sobrou para as prefeituras, que prestam o serviço junto à população.
As três áreas essenciais – saúde, educação e assistência social – estão muito comprometidas.
Quanto deixou de ser repassado pela União e pelo Estado?
Os municípios brasileiros gastam, por ano, R$ 60 bilhões como complemento para garantir o funcionamento dos programas federais. São, ao todo, 390 programas, entre eles o transporte escolar, o programa de saúde da família e o Bolsa Família. O governo criou, e os municípios são obrigados a aderir. Sem correção, não tem mais como suportar. Daí, temos uma educação ruim, serviços que vão se esgotando.
O senhor está dizendo que as prefeituras, de uma maneira geral, estão falidas?
Estamos vivendo a falência dos municípios e, principalmente, do serviço público. O cidadão diz: "Eu pago imposto, mas o serviço está diminuindo". Isso é real. Todo o dinheiro arrecadado vai para Brasília e não chega na ponta, para o cidadão.
PAULO ZIULKOSKI
Presidente da CNM
Sim. Estamos vivendo a falência dos municípios e, principalmente, do serviço público. O cidadão diz: "Eu pago imposto, mas o serviço está diminuindo". Isso é real. Todo o dinheiro arrecadado vai para Brasília e não chega na ponta, para o cidadão. Não temos mais dinheiro para nada.
Algumas prefeituras têm atrasado salários. Outras administrações podem seguir o mesmo caminho?
Não tenho dúvida disso. E observe que não são apenas pequenas prefeituras. Quem tem problema são municípios como Porto Alegre, que nunca havia atrasado salários. Administrações de pequenas e médias cidades também têm problemas, mas a crise chegou às grandes. Isso revela que a forma de governar dando "almoço grátis" não existe mais. Foram criados vários benefícios e direitos, como piso do magistério, o aumento para algumas categorias. Como custear isso? O preço está sendo cobrado agora. O teto é outro caso. Câmaras de Vereadores têm um teto estabelecido de gastos. E todos querem gastar o teto. Para algumas, o teto é 7% da arrecadação da prefeitura. E os vereadores vão gastar. E vai dizer o quê? Eles dizem que está na lei.
Qual é a solução?
A resposta passa pela definição da questão federativa, de transparência e de fiscalização. Olha o caso da Lava-Jato. Houve irregularidades por 15, 20 anos, que só agora vieram à tona. Onde estava a fiscalização na destinação dos recursos?
As prefeituras têm cortado recursos de eventos - como o Carnaval, por exemplo. As prefeituras fazem certo ao cortar?
Nunca deveria ter havido almoço grátis. O erro foi esse. Foram fazer o convite para o almoço, encheram a mesa, todo mundo discursou, brindou. Depois vem o cara te cobrar. Criaram um benefício, um evento para a população, depois falta para outras coisas. Como é que a prefeitura vai financiar isso se não tem dinheiro? Se tivesse dinheiro, tudo bem. Mas a prefeitura tem de atender primeiro a saúde, a educação, e não fazer bailes, festas.
Não adianta dar pão e circo. Tem que ter o enfrentamento da realidade. Terminou essa fase do populismo barato de criar tudo isso e depois não ter dinheiro para pagar.
Qual é a sua opinião sobre financiamento de eventos como o Carnaval e outras festas tradicionais?
Isso é polêmico, porque atinge setores populares que são ligados a esses eventos. Eventos montados a partir de uma estrutura pública precisam ser analisados caso a caso. Há aqueles que atraem público de fora, lotam hotéis, geram receita. Mas há exageros que precisam ser cortados. E, para alguns, pode haver mobilização junto à iniciativa privada para buscar recursos.
Isso vale para todos os tipos de eventos?
Claro. Mas é preciso ressaltar: esse ainda não é o problema maior das prefeituras. Um exemplo: nós temos, no Brasil, 5.568 prefeitos, 57.500 vereadores e mais secretários, subsecretários. Isso tudo com diversos partidos tentando governar, fazendo indicações às vezes desnecessárias para os cargos. É preciso fazer gestão.