O título em português, Segredos de um Escândalo, é tão batido que parece já ter sido usado um milhão de vezes. Mas, neste caso, é preciso dar uma colher de chá para quem foi encarregado de rebatizar o filme: uma tradução literal de May December (Maio Dezembro) não diria mesmo muita coisa para o espectador brasileiro.
Nos EUA, a expressão é usada como sinônimo de uma relação amorosa com uma notável diferença de idade entre os parceiros. A origem é um clássico da música popular norte-americana, September Song, composto por Kurt Weil e Maxwell Anderson em 1938. A letra da canção fala sobre a passagem do tempo e compara as estações do ano com as diferentes etapas da vida: “É muito, muito tempo de maio a dezembro / E os dias ficam mais curtos quando se chega a setembro / E o clima de outono transforma as folhas em chamas / E eu não tenho mais tempo para esperar”.
Dirigido por Todd Haynes, May December é livremente baseado em uma história que escandalizou a opinião pública americana no final da década de 1990: o relacionamento de uma professora de 35 anos, Mary Kay Letourneau, com um menino de 12, colega de um dos seus quatro filhos. O caso resultou em prisão, dois filhos e um casamento de quase 15 anos, oficializado quando o menino chegou à maioridade, e a mulher saiu da cadeia (Mary Kay morreu em 2020, aos 58 anos). O filme imagina como seria a vida dessa família, formada em meio a doses generosas de paixão, frenesi midiático, confusão emocional – e crime.
Uma relação “maio dezembro” ainda mais conhecida, mas considerada absolutamente normal, inspira Priscilla, outro filme que estreia no Brasil nas próximas semanas. Dirigido por Sofia Coppola, o filme acompanha o namoro (a partir de 1959), o casamento (em 1967) e a separação (em 1973) de Priscilla e Elvis Presley – a partir do ponto de vista da mulher, que tinha apenas 14 anos quando começou a namorar um dos homens mais famosos do planeta. Enquanto Elvis lidava com a fama, a carreira e toneladas de remédios, Priscilla era a Barbie-esposa treinada para se submeter alegremente aos caprichos do rei desde a adolescência.
Além da ligação desigual entre parceiros de idades tão diferentes, os dois filmes têm em comum a sensibilidade para abordar um tema delicado de forma sutil e madura. (Tente explicar para alguém da geração Z como é possível que Caetano tenha começado namorar Paula Lavigne quando ela tinha 13 anos, e ele 40, sem quase ninguém ter achado estranho na época.) Priscilla e May December provam que é possível tratar o assunto evitando o falso moralismo, sem perder de vista que até mesmo um grande amor pode ter seu lado sombrio – e que até nas sombras pode nascer um grande amor.