Muito antes de os diários da herdeira de Genovia virarem best-seller ou de as personagens da Disney serem agrupadas em uma franquia bilionária para vender bugigangas, a princesa favorita de todas as meninas do mundo (talvez até de Diana Spencer) era Romy Schneider.
Romy não era Sissi e nem mesmo Sissi, a personagem da trilogia de filmes lançada nos anos 1950, era uma versão muito fiel da verdadeira Elizabeth da Baviera (1837 - 1898), imperatriz da Áustria que ficou famosa pela beleza. Para as meninas da minha geração, isso não importava. Romy Schneider era Sissi, e Sissi era a princesa que nós amávamos.
Aos 35 anos, no auge do sucesso e da beleza, a atriz teve a chance de revisitar a personagem que havia interpretado na adolescência em um filme dirigido ao público adulto – e não às meninas de 12 anos. Em Ludwig (1973), do diretor italiano Luchino Visconti, Sissi já não é ingênua ou insegura, mas uma mulher forte, um pouco cínica, sem qualquer ilusão a respeito do amor romântico ou da nobreza dos nobres. Outras Sissis viriam depois. Nenhuma tão deslumbrante quanto Romy Schneider sob a direção de Visconti.
Ao contrário das fadas e das sereias, as princesas das fábulas são supostamente humanas – o que não as impede de serem perfeitas, em forma e conteúdo. Como as bruxas, essas personagens expressam fantasias corriqueiras a respeito do feminino: bruxas são sempre velhas e más, princesas sempre jovens e gentis. Que algumas mulheres de verdade tenham morrido por serem tachadas de bruxas e outras ainda hoje usem coroas para marcar a distinção da família ou do casamento é apenas um dos tantos aspectos da realidade que parece absurdo demais para não ser ficção.
Como britânicos e americanos em relação a Lady Di, alemães e austríacos continuam voltando a Sissi. (Ambas completaram o arco que vai do conto de fadas à tragédia – o que é péssimo para pessoas de verdade, mas ótimo para personagens de ficção.) Em 2022, Elizabeth da Baviera voltou à cena em duas novas produções: a série alemã A Imperatriz (Netflix) e o filme Corsage, da diretora austríaca Marie Kreutzer. A Imperatriz é uma espécie de The Crown do Império Austro-Húngaro, combinando História e fabulação de forma a manter o público de streaming interessado por seis episódios iniciais e uma recém-anunciada segunda temporada. Corsage, que deve estrear em breve nos cinemas de Porto Alegre, é mais ambicioso e ousado, em todos os sentidos.
Como se fosse uma princesa da Disney, uma influencer do Instagram ou mesmo uma mulher comum com autoestima baixa, a Sissi de Marie Kreutzer não pode envelhecer, engordar ou sequer parecer humana: a beleza fez da imperatriz uma escrava. Na vida real, Elizabeth da Baviera foi assassinada em Genebra por um anarquista italiano, aos 60 anos. Em Corsage, Sissi ganhou a chance de, pelo menos na ficção, reescrever seu destino – e permanecer jovem para sempre.