Para quem, como eu, acredita nas pesquisas, nas urnas eletrônicas e na capacidade da democracia brasileira de fazer frente a qualquer tipo de tentativa de invasão bárbara, 2023 já começou. Torço para que os próximos três meses sejam como aqueles últimos dias de aula antes das férias de verão: nenhuma matéria nova, nenhuma briga no pátio e todo mundo que passou de ano já antecipando as delícias da descompressão.
Como sou aquele tipo de pessoa que espreme o limão até que saia algo parecido com uma limonada, já comecei a fazer o balanço das lições que consegui extrair dos últimos quatro (longos) anos da História brasileira. Dentro do espírito nietzschiano do “tudo o que não me mata me torna mais forte”, aprendi, na prática, o que antes era conhecimento, digamos, teórico. Por exemplo:
1) Nenhuma ideia é tão ruim que não possa voltar – Se me dissessem, há 10 anos, que multidões de brasileiros, fardados com camisetas da Seleção Brasileira e portando cartazes escritos em (mau) inglês, iriam às ruas pedindo a volta da ditadura, intervenção no Judiciário e outras delicadezas do gênero, eu demitiria o roteirista da série na hora. Parece loucura – e é –, mas a História nem sempre anda pra frente. Nenhuma novidade nisso, claro. Mas há coisas que a gente só aprende quando dói no nosso calo.
2) Nenhuma ideia é tão boa que não corra perigo – No Brasil, nos acostumamos a ver coisas que não funcionam porque nunca saíram do chão ou nunca ficaram prontas. Nos últimos quatro anos, foi diferente: pela primeira vez, experimentamos a angústia de quem vê o barraco de madeira erguido a duras penas durante décadas sendo colocado abaixo por uma tempestade de canetaços. Vale para o controle das armas, a proteção da Amazônia, o acesso à educação, o incentivo à cultura… Construir dá trabalho e leva tempo. Para destruir, basta uma caneta Bic.
3) Nenhuma mentira é tão absurda que não possa convencer alguém – “Os ingleses seguem o princípio de que, quando se mente, deve-se mentir grande e seguir firme. Eles mantêm suas mentiras, mesmo correndo o risco de parecer ridículos.” A frase é de Joseph Goebbels, o propagandista de Hitler, e foi escrita há mais de 80 anos, mas nunca nos lembramos tanto dela quanto nos últimos quatro anos. Os falsos poderes da cloroquina, a desconfiança nas urnas eletrônicas e nas vacinas, a eterna preocupação com a “ameaça do comunismo”: a estratégia de repetir mentiras até convencer parece batida, mas, vai entender, ainda cola.
Em resumo, chega de limonada.