A polarização política se transformou em polarização social, e a disputa não é mais entre partidos, mas entre grupos sociais. Para sustentar essa tese, o cientista político Felipe Nunes (@felipnunes) reuniu alguns dados extraídos de uma pesquisa da Genial/Quaest em um fio publicado no Twitter. O levantamento mostra que: 1) ricos se dividem, mas pobres votam Lula (56 x 22), 2) brancos se dividem, mas pretos votam Lula (59 x 23), 3) Sul se divide, mas Nordeste vota Lula (61 x 22), 4) homens se dividem, mas mulheres votam Lula (50 x 24).
Vamos nos deter um pouco nesse último item.
A pesquisa Datafolha divulgada no final de maio destacou a preferência do eleitorado feminino por Lula e a forte rejeição a Bolsonaro, tendência que se espalha por todas as faixas etárias, classes sociais e inclusive entre as evangélicas. "Aversão a Bolsonaro é dominante entre mulheres pobres e ricas", mancheteou o jornal Folha de S. Paulo no dia 30 de maio.
Ignorando metade do seu eleitorado potencial, Bolsonaro sempre fez questão de forjar a imagem de arauto da misoginia triunfante — aquele tipo de desprezo pelas mulheres que muitos homens sentem, mas poucos têm coragem de expressar publicamente de forma tão tosca. Encontrou seu nicho entre os eleitores apresentando-se como defensor de brinquedinhos masculinos, as armas, e porta-voz daqueles que sentem vontade de gritar um bom "quem manda aqui sou eu" dentro de casa de vez em quando. Não surpreende que, como presidente da República, sonhe em se comportar da mesma forma.
O ressentimento contra as mulheres que Bolsonaro simboliza não se limita à perda do mando de campo dentro de casa, estendendo-se à disputa por espaços no mercado de trabalho (no início do ano, Eduardo Bolsonaro chegou a atribuir à contratação de mulheres o desabamento de um trecho de asfalto na Marginal Tietê) e aos novos modelos de comportamento impulsionados pela chamada "terceira onda" do feminismo.
Em sua versão cotidiana, a misoginia se manifesta no recreio do colégio, no vestiário do clube, na mesa de bar, no escritório, no estádio de futebol… Em sua versão mais letal, alimenta as estatísticas de violência doméstica. (Dados apresentados no Dossiê dos Feminicídios no RS, da organização Lupa Feminista, mostram que 95 mulheres foram mortas no Estado em 2021 nesse tipo de crime, uma a cada 3,8 dias.) A misoginia nem precisava de Bolsonaro para prosperar no país, mas a presença de um garoto-propaganda no Palácio do Planalto sinaliza para os ogros que é OK sair da toca.
Mulheres rejeitam Bolsonaro não apenas pelo que ele faz ou diz, mas pela visão de mundo que ele representa.