Os dois são jovens, bonitos, ambiciosos – e trambiqueiros. Anna Delvey (Anna Sorokin, nos documentos) é a protagonista da série Inventando Anna. Simon Leviev (na verdade, Shimon Hayut) é o personagem do documentário O Golpista do Tinder.
Em cartaz na Netflix, série e filme contam histórias parecidas de ascensão, glória nas redes sociais, cadeia e fama planetária (apesar da exposição de todas suas pilantragens). Anna consegue enganar a elite nova-iorquina posando de herdeira europeia esnobe e sofisticada. Simon convence mulheres a lhe emprestarem dinheiro acenando com uma vida de luxo, romance e aventuras. Ambos são derrotados pela “hybris” – a desmedida dos que se sentem tão superiores aos demais que acabam sucumbindo aos próprios excessos.
Anna e Simon não são os únicos trambiqueiros da temporada. Elizabeth Holmes, condenada no início de janeiro por crimes de fraude e conspiração, é a personagem do documentário A Inventora: À Procura de Sangue no Vale do Silício (HBO), que narra como uma jovem empreendedora foi capaz de atrair investimentos bilionários para sua startup vendendo um único produto que realmente funcionava: a própria autoconfiança.
O quarto nome deste verão da trapaça é Stanton Carlisle, personagem do filme O Beco do Pesadelo, de Guillermo del Toro, que está concorrendo ao Oscar em quatro categorias. A história do falso vidente (com perdão do pleonasmo) é baseada no livro Nightmare Alley (1946), de William Lindsay Gresham, adaptado para o cinema pela primeira vez em 1947. Com Tyrone Power no papel principal, o filme O Beco das Almas Perdidas é uma pequena joia do cinema noir (disponível no YouTube, aliás), que por sua vez viria a inspirar a novela O Astro (1977), de Janete Clair.
Usando recursos modernos (Tinder, Instagram, ideias “disruptivas”...) ou contando apenas com seu excepcional poder de sedução, trapaceiros são sempre fascinantes. Não apenas pelo talento para mentir, enganar e tramar enredos fabulosos (nos EUA, o termo “con artist”, algo como “artista da trapaça”, é usado como sinônimo de golpista), mas pela capacidade de identificar e explorar as fraquezas de seus alvos.
Para enganar tanta gente durante tanto tempo, não basta ser astucioso. É preciso que as vítimas colaborem de alguma forma, permitindo que o golpista diga exatamente o que elas querem ouvir. Como a maioria das pessoas se acha mais esperta do que realmente é (inclusive os próprios vigaristas), o verão da trapaça é uma estação que não tem dia para acabar.